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Prisão de Carlos Ghosn encerra trajetória de sucesso na Renault-Nissan

Elaine Lies, Ritsuko Ando

Da Reuters

19/11/2018 14h48

Executivo brasileiro foi acusado de fraude financeira e será demitido da empresa

O CEO da aliança Renault-Nissan, Carlos Ghosn, foi preso nesta segunda-feira (19) por fraude financeira e será demitido do comando das empresas. A decisão é um desfecho melancólico na carreira de um líder carismático que salvou a empresa japonesa da falência.

Segundo a Nissan, a investigação interna começou após uma denúncia de que Ghosn estaria desviando dinheiro da empresa, declarando ganhos abaixo da realidade por anos.

O CEO da empresa, Hiroto Saikawa, afirmou que havia muito poder concentrado nas mãos de Ghosn, um caso raro de executivo estrangeiro que gozava de status de "astro do mundo corporativo" no Japão após impedir o fim da Nissan.

"Olhando para trás, a concentração de poder (em torno de Ghosn) é algo que precisamos refletir sobre", afirmou Saikawa, que confirmou a prisão de Ghosn.

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Saikawa afirmou que não pode revelar detalhes sobre como o dinheiro da empresa foi utilizado de forma pessoal, mas afirmou que a conduta equivocada é algo "sério e inaceitável", especialmente por ter sido realizada por anos a fio. Ghosn não se pronunciou sobre o assunto.

"Me sinto profundamente decepcionado e arrependido por ele ter desapontado a confiança de tantas pessoas. É até difícil de expressar isso... Não é só um sentimento de revolta e, para mim, desânimo", admitiu.

De acordo com Saikawa, um encontro com membros do conselho administrativo da Renault-Nissan será realizado na próxima quinta-feira (22) para oficializar as saídas de Ghosn e de Greg Kelly, diretor representativo que também teria cometido as ilegalidades.

O presidente da França, Emmanuel Macron, afirmou que o governo, acionista majoritário da Renault, acompanhará de perto os passos da montadora e de sua aliança com a Nissan.

As ações da Renault despencaram 11% na Bolsa de Paris, ficando entre as mais desvalorizadas da Europa. Na Alemanha, as ações da Nissan caíram 10%.

Cortando custos

Apelidado de "Le Cost Killer" ("O Matador de Custos", em bom português), Ghosn atingiu grande popularidade no Japão mesmo após cortar milhares de empregos e fechar fábricas logo após assumir o comando da Nissan em meados dos anos 2000.

A imprensa japonesa afirma que Ghosn teria embolsado 10 bilhões de ienes (R$ 333,7 milhões) de compensação de horas por ano, mas declarou apenas metade deste volume (5 bilhões de ienes, ou algo como R$ 167 milhões) à empresa por vários anos.

A saída de Ghosn levanta dúvidas sobre o futuro da aliança que ele mesmo moldou e consolidou até o momento em que decidiu deixar o comando em 2017, cargo que retomou pouco tempo depois e ocupava até sua prisão.

"O preço inicial das ações mostra seu papel de destaque na aliança", analisa Raghav Gupta-Chaudhary, analista financeiro do Citi Group. O especialista ressalta ainda que a parceria entre as empresas desvalorizou o valor das ações da Nissan por anos.

Atualmente, a Renault detém 43,4% das ações da Nissan, enquanto a Nissan possui 15% da Renault e não tem direito a voto nas decisões da aliança firmada em 1999. Desde 2016, a Nissan possui 34% das ações da conterrânea Mitsubishi.

Governo em cima

A prisão de Ghosn também coloca em xeque o futuro da Nissan justamente em uma época na qual as autoridades japonesas são pressionadas a vigiar de perto a conduta das maiores empresas do país. O jornal "Asahi" noticiou que procuradores de Justiça iniciaram buscas na sede da Nissan e outros escritórios já nesta segunda-feira.

Nascido em Guajará-Mirim (RO), Ghosn vem de família com origem libanesa e tem cidadania francesa. Após estudar na França, ele iniciou sua carreira na Michelin, onde permaneceu até o final dos anos 90, quando foi para a Renault. O executivo migrou para a Nissan em 1999 após a aquisição da empresa pela Renault e virou CEO da marca japonesa em 2001. Ghosn permaneceu no cargo até 2017.

Em junho deste ano, acionistas da Renault aprovaram uma remuneração de 7,4 milhões de euros (quase R$ 32 milhões) pelos serviços prestados no ano passado. Além dessa quantia, ele recebeu mais 9,2 milhões de euros (aproximadamente R$ 39,6 milhões) de salário como mandachuva da Nissan.