Topo

Ele comprou um carro elétrico usado e gasta R$ 30 para rodar 480 km

Clemente Gauer trouxe dos Estados Unidos um cabo especial para recarga "inteligente" de seu i-MiEV 2011 - Arquivo pessoal
Clemente Gauer trouxe dos Estados Unidos um cabo especial para recarga "inteligente" de seu i-MiEV 2011
Imagem: Arquivo pessoal

Alessandro Reis

Colaboração para o UOL, em São Paulo (SP)

08/08/2018 04h00

Encontramos o dono de um Mitsubishi i-MiEV 2010/2011 e perguntamos tudo sobre seu carrinho compacto e totalmente elétrico

Gente interessada em comprar carro elétrico ou híbrido tem desconfianças sobre aspectos como autonomia, custo de recarga e duração das baterias -- afinal, como nos celulares, baterias têm vida útil e, depois de determinado tempo, deixam de reter a carga.

Vale lembrar também que elas são um dos itens mais caros nesses tipos de veículos, portanto é natural se perguntar o quanto elas realmente são capazes de durar -- hoje em dia, fabricantes como a Toyota oferecem oito anos de garantia para esse importante componente.

Com isso surge a pergunta: vale a pena investir em um elétrico ou híbrido usado, fabricado há alguns anos? Vou ter problemas com a bateria gasta e precisar investir um caminhão de dinheiro em um conjunto novo?

Para responder, UOL Carros achou o dono de um Mitsubishi i-MiEV 2010/2011, comprado com 7.300 km rodados, para saber a resposta.

Veja mais

+ Gênios ou malucos? Eles converteram Gol, Gurgel e Fusca em elétricos
+ Quer negociar hatches, sedãs e SUVs? Use a Tabela Fipe

+ Inscreva-se no canal de UOL Carros no Youtube
+ Instagram oficial de UOL Carros
+ Siga UOL Carros no Twitter

Clemente Gauer, 37, engenheiro de sistemas residente na capital paulista, é dono de um Land Rover Defender e de um Subaru Forester, mas queria há algum tempo agregar um modelo 100% elétrico à sua garagem.

"Sou um 'petrolhead' de verdade. Tenho paixão por carros e sempre quis um elétrico, pelos benefícios à natureza, pela qualidade do ar. É uma questão moral. Tenho produção de eletricidade em casa, usando placas solares, e queria aproveitar o excedente de energia gerada para abastecer um veículo. Tinha receio em relação à condição das baterias de íons de lítio por conta da idade do veículo, mas resolvi assumir o risco. Se desse tudo errado, poderia desmontá-lo e vender as peças para pessoas interessadas em converter um veículo a combustão em elétrico", conta o engenheiro, que vai para o trabalho de bicicleta e buscava um automóvel para deslocamentos urbanos. "Não importava tanto a autonomia", revela.

Gauer começou a pesquisar dentre as poucas opções disponíveis no mercado -- hoje, o único modelo com propulsão 100% elétrica zero km à venda no Brasil é o BMW i3, que usa um motor a combustão de scooter como gerador para ampliar a autonomia. Ele tem preço inicial na faixa dos R$ 200 mil.

"Além do preço alto, o i3 tem pneus de medida exclusiva e cada um custa R$ 2,5 mil na concessionária. Fora isso, queria um carro sem motor a combustão e seus custos de manutenção, por isso também descartei o Toyota Prius. Foi então que comecei a pesquisar e um amigo replicou em uma rede social o anúncio de um Mitsubishi i-MIEV 2012 com apenas 2.000 km rodados em uma concessionária de Sete Lagoas, em Minas Gerais", explica.

Gauer soube que o i-MIEV já tinha sido vendido por R$ 63 mil. O vendedor, no entanto, disse que tinha outro exemplar para venda, com pouco mais de 7.000 km no hodômetro. "Ele pediu R$ 68 mil. Após negociação, fechamos por R$ 57,5 mil. Aparentemente, era um carro de demonstração, para test-drive e avaliação de jornalistas, com pintura vermelha contrastando com portas, capô e tampa traseira brancas", relata. Gauer manteve o visual original inalterado após fazer a compra.

Clemente Gauer conta com vagas especiais para carregamento de elétricos em SP - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Clemente Gauer conta com vagas especiais para carregamento de carros elétricos espalhados por SP
Imagem: Arquivo pessoal

i-MiEV comprado

Para seu alívio, segundo ele mesmo diz, as baterias de 16 kWh estavam "muito boas". "Pesquisei na internet e soube que a autonomia prometida pela fabricante era de cerca de 160 km com uma carga completa e, em condições normais de uso, essa distância caía para aproximadamente 120 km. Fiz test-drive com as baterias cheias antes de fazer a compra e consegui rodar 90 km, restando bastante carga. Estava dentro do que eu esperava", relata.

Depois de comprar o i-MiEV, Gauer comprou um equipamento para checar o estado das 88 células do pack de baterias e confirmou a boa condição. "Já consegui rodar 118 km até a energia se esgotar", conta, destacando que em um mês já rodou cerca de 800 km com seu modelo elétrico -- a maioria deles percorrida pela mulher, que usa o Mitsubishi também para transportar sua filha.

Clemente Gauer investiu mais US$ 400 para trazer dos Estados Unidos um cabo especial para recarga "inteligente", que permite programar o horário desejado para preencher as baterias -- o carro já tem o carregador embutido. Também comprou um adaptador para usar carregadores do padrão L2 europeu, já que o i-MiEV tem padrão norte-americano. Gastou, ainda, mais R$ 2,9 mil de seguro, cobrindo o valor pago pelo carro.

"Uma recarga por semana é suficiente para o quanto rodamos. Minha maior preocupação é que o i-MiEV estivesse esse tempo todo plugado em uma tomada ou totalmente descarregado, o que prejudicaria a vida das baterias. Não foi o caso. Desde quando comprei, só carreguei as baterias 100% uma vez. Procuro manter a carga sempre abaixo de 80%, o que ajuda a preservá-las", explica.

O engenheiro só paga R$ 30 de tarifa mínima de energia por conta dos painéis solares, mas estima que, pagando a tarifa normal, gastaria cerca de R$ 30 para rodar 480 km. Com seu Forester, o gasto é de aproximadamente R$ 400 para percorrer a mesma distância.

"Uma recarga por semana é suficiente para o quanto rodamos", explica o engenheiro - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
"Uma recarga por semana é suficiente para o quanto rodamos", explica o engenheiro
Imagem: Arquivo pessoal

Sem preocupação

Originalmente, o carro era coberto por garantia de três anos. A cobertura já expirou, mas Gauer não se diz preocupado após confirmar a saúde das baterias. Segundo ele, elas são hoje cobertas por oito anos de garantia na Europa, um dos mercados onde o i-MiEV ainda é vendido, com o mesmo visual -- e baterias menores, de 14 kWh. "O plano de manutenção é muito simples: prevê troca do fluido de freio a cada dois anos, teste das baterias a cada 12 meses e substituição das pastilhas de freio a cada 500 mil km, já que elas são pouco exigidas por conta do sistema elétrico, que naturalmente "segura" o carro ao se retirar o pé do pedal do acelerador, como parte da tecnologia de recarga das baterias nas desacelerações", explica.

Consultada, a HPE Autos, representante oficial da Mitsubishi no Brasil, informa que "a assistência técnica permanece" em relação ao i-MIEV.

Quanto à experiência com o carro, Gauer se diz satisfeito. "O carro é bem compacto, considerado um 'kei car' no Japão. Tem bom espaço para quatro adultos, perfeito para rodar na cidade. Além disso, é bem equipado, com Isofix, controles de tração e estabilidade, seis airbags, ar-condicionado, espelhos elétricos rebatíveis e chave com controle remoto. O câmbio tem relação única: é só colocar no 'D' e acelerar. Dá também para desligar o sistema de aproveitamento da energia nas frenagens, desativando o efeito 'freio-motor'. Além disso, roda em total silêncio e tem tração traseira, o que é ótimo para quem gosta de dirigir como eu. É um carro para saborear", elogia.

No curto período no qual foi importado oficialmente, entre 2010 e 2012, apenas sete unidades do i-MiEV foram trazidas ao país, informa a Mitsubishi. Algumas delas receberam esse visual -- uma delas, inclusive, foi avaliada pelo UOL Carros em 2011 e trazia a mesma pintura do carro de Gauer -- mas já checamos e não se trata do mesmo veículo. Outra dessas unidades, que aparentemente também não é a do engenheiro, chegou a ser dirigida pelo ex-presidente Lula.

A HPE Autos informa que na época o compacto elétrico tinha preço sugerido de R$ 200 mil, mas cada venda foi "negociada caso a caso". A empresa informa, ainda, que a importação do i-MiEV do Japão foi interrompida por conta do "valor de venda muito alto devido a falta de incentivos" do governo.

Vale lembrar que o imposto de importação era de 35% e o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), de 25% para veículos elétricos importados. Hoje, carros do tipo já não recolhem o imposto de importação e, com o anúncio do Rota 2030, o IPI para elétricos e híbridos vai cair para uma faixa entre 7% e 20% a partir de meados de novembro.

Quanto ao destino das sete unidades trazidas para cá, a HPE diz o seguinte: "Das sete unidades trazidas, duas ficaram com a HPE por um período, quando foram cedidas para teste a jornalistas. Ao decidirmos interromper a importação, vendemos as duas unidades e atualmente não temos nenhuma em nossa frota".

Uma delas está com Gauer, que avisa que pretende trocar em 2019 seu Mitsubishi por um Bolt -- o modelo 100% elétrico da Chevrolet deve começar a ser vendido por aqui no ano que vem, juntamente com o Nissan Leaf, também com propulsão totalmente elétrica.