Topo

Airbag só salva se passageiro tiver postura correta no carro; entenda

Leonardo Felix

Colaboração para o UOL, em São Paulo (SP)

21/07/2014 13h07

Há pouco mais de um mês, UOL Carros mostrou na prática qual a diferença entre ter ou não o sistema ABS (antiblocante) nos freios de seu carro. É uma informação necessária, já que o item de segurança se tornou obrigatório em todos os carros produzidos no Brasil a partir deste ano.

Além dele, o Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) também tornou indispensável a presença dos airbags frontais, aquelas bolsas infláveis que, em caso de acidente, evitam o impacto direto de motorista e passageiro do banco dianteiro contra o volante ou painel do veículo. 

Teste de impacto frontal do Volkswagen up! no Latin NCAP - Divulgação - Divulgação
Teste de impacto do Volkswagen up! no Latin NCAP. Airbags foram cruciais para obtenção da nota máxima em segurança para os passageiros da frente
Imagem: Divulgação
Por enquanto, a resolução 311/2009 do Contran (Conselho do Denatran) obriga apenas a instalação dos dispositivos frontais. Eles ficam sob o volante (no caso do motorista) e o painel (passageiro), e servem para prevenir traumas cranianos, faciais e da parte superior do corpo.

Não é o ideal (são necessários mais airbags), mas se trata de medida importante. Atualmente, o Brasil é um dos países que mais contabilizam mortes no trânsito -- cerca de 35 mil por ano, ou 17,5 a cada 100 mil habitantes, de acordo com o Cesvi (Centro de Experimentação e Segurança Viária) -- e há várias explicações para isso: o mau comportamento dos motoristas brasileiros, a baixa qualidade de nossa malha rodoviária e, também, a frágil segurança de nossos automóveis.

Os airbags agem para minorar pequena parte desse problema. Segundo o Cesvi, se instalado em todos os automóveis e comerciais leves de nossa frota, o dispositivo teria potencial para evitar pelo menos 1,5% das mortes em nossas vias, e amenizar cerca de 10 mil ferimentos causados por colisões. "Pode não parecer muito, mas, em se tratando de acidentes graves, são números consideráveis", ressalta Oliver Schulze, membro da comissão de segurança veicular da SAE Brasil, uma associação de engenheiros automotivos.

A diferença entre contar ou não com o dispositivo no momento de um acidente pode ser entendida nos dois vídeos abaixo, que comparam testes de impacto da Latin NCAP feitos com o mesmo modelo: um Volkswagen Gol 1.6 Trend 2010. No primeiro, o compacto está equipado com as bolsas protetoras; no segundo, não.

Comparativo: crash test do Volkswagen Gol com e sem airbags frontais
1 | 2

Mas, apesar de a definição como "item de segurança passiva" (em que não há interferência humana no funcionamento) sugerir o contrário, o dispositivo não funciona plenamente sem a colaboração de quem está no automóvel. Adotar postura adequada dentro de um carro é condição indispensável para que o item cumpra seu papel da maneira mais eficaz possível, mesmo em acidentes aparentemente "inofensivos". Confira algumas dicas: 

NEM COM A CARA NO VIDRO, NEM COM O BANCO DEITADO
A posição do motorista ou passageiro em relação ao painel do carro interfere diretamente no funcionamento do airbag. Isso porque uma colisão acontece em intervalo de 100 a 150 milésimos de segundo (o mesmo tempo de um piscar de olhos) e, ao detectá-la, o dispositivo demora cerca de 30 milésimos para ser disparado. 

Manter bancos a cerca de 25 cm do volante e com inclinação leve (imagem de cima) contribui para contato com o airbag no tempo certo em caso de emergência. Se o assento ficar muito inclinado (imagem central), o ocupante pode enroscar o pescoço no cinto e sofrer traumas na traqueia. Se estiver muito para frente (imagem de baixo), tende a bater contra o painel antes da deflagração total das bolsas - Murilo Góes/UOL - Murilo Góes/UOL
Manter bancos a cerca de 25 cm do volante e com inclinação leve (centro) contribui para contato com o airbag no tempo certo. Se o assento ficar muito inclinado (à esquerda), o ocupante pode enroscar o pescoço no cinto e sofrer traumas na traqueia. Se estiver muito para frente (à direita), tende a bater contra o painel antes da deflagração total das bolsas
Imagem: Murilo Góes/UOL
Embora o sensor seja programado a calcular essa distância, reduzindo o tempo de acionamento em situações especiais, a vítima que estiver demasiadamente perto do painel pode não pegar o airbag no meio do processo de deflagração durante o impacto. Já em um cenário oposto -- ou seja, quando o banco está muito afastado ou "deitado" -- o ocupante tende a sofrer do chamado "efeito submarino", que é quando o corpo desliza pelo cinto e fica preso pelo pescoço, provocando traumas cervicais e até morte por asfixia.

Por isso, o ideal é que o indivíduo esteja a aproximadamente 25 centímetros do módulo, com alguns centímetros de tolerância para que seja confortável manusear o volante e acionar os pedais com os pés. O 12 vezes campeão brasileiro de Stock Car, Ingo Hoffmann, explica aqui qual o posicionamento mais adequado na hora de dirigir.

O CINTO É BOM COMPANHEIRO, DESDE QUE BEM AJUSTADO
Andar sem o cinto de segurança é praticamente anular os efeitos do airbag. Os dois itens são muito mais eficazes quando combinados. "Alguns cintos já possuem pré-tensionadores, que amenizam gradativamente o "tranco" e dão mais tempo para a bolsa agir antes do contato do corpo com o painel", explica Dino Lameira, técnico especialista em carros da Proteste (Associação Brasileira de Defesa do Consumidor). 

Quando ajustado da forma correta (imagem de cima), cinto minimiza traumas e lesões provocados em acidentes. Por outro lado, deixá-lo muito próximo ao pescoço (imagem central) gera risco de estrangulamento no ato da colisão, enquanto mantê-lo muito baixo, passando pelo braço em vez do ombro (imagem de baixo), aumenta chances de deslocar ombro ou clavícula - Murilo Góes/UOL - Murilo Góes/UOL
Quando ajustado da forma correta (centro), cinto minimiza traumas e lesões provocados em acidentes. Por outro lado, deixá-lo muito próximo ao pescoço (à esquerda) gera risco de estrangulamento no ato da colisão, enquanto mantê-lo muito baixo, passando pelo braço em vez do ombro (à direita), aumenta chances de deslocar ombro ou clavícula
Imagem: Murilo Góes/UOL
Porém, o próprio cinto pode causar traumas graves se posicionado de forma incorreta junto ao corpo. "Ele tem que passar em diagonal pelo ombro e abdômen. Se ficar na altura do pescoço, pode provocar traumas na traqueia no momento do impacto; se estiver muito baixo, potencializa deslocamento de clavícula e ombro", aponta Ivan Rocha, médico do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas de São Paulo (SP).

É mais fácil ajustar a posição em veículos com regulagem de altura dos bancos e dos cintos, especialmente para as crianças ou adultos mais baixos. Caso o seu não tenha, uma almofada de apoio ou assento de elevação podem resolver o problema. E nada de usar presilhas para afrouxar o cinto. Além de prejudicarem sua ação numa emergência, essas peças são proibidas por lei.

PAINEL NÃO É APOIO PARA OS PÉS
Em viagens longas, quando a falta de espaço e de movimentação começam a incomodar,  é comum ver passageiros usando o painel dianteiro como apoio para os pés. Entre todos os itens aqui citados, este é de longe o mais perigoso. No caso de um acidente, as pernas estarão totalmente vulneráveis à deformação do habitáculo e à própria força de disparo do airbag, além de absorver os "trancos" do corpo contra o painel. 

Passageiros precisam tomar cuidados especiais com o posicionamento das pernas. Apoiá-las no painel (imagem de baixo) implica grandes riscos de lesões provocadas pelo impacto ou pelo próprio disparo do airbag, mesmo em batidas mais leves - Murilo Góes/UOL - Murilo Góes/UOL
Passageiros precisam tomar cuidados especiais com o posicionamento das pernas. Apoiá-las no painel (à direita) implica grandes riscos de lesões provocadas pelo impacto ou pelo próprio disparo do airbag, mesmo em batidas mais leves
Imagem: Murilo Góes/UOL
"A vítima fica muito vulnerável a sofrer fraturas na tíbia, rótula, fêmur e pés, mesmo em batidas leves", afirma o médico do Hospital das Clínicas. Em situações extremas, pode ocorrer até mesmo a amputação de parte dos membros inferiores. 

COMO FUNCIONAM
Os airbags atuais são montados com sensores eletrônicos que monitoram continuamente os dados de condução. Ao constatarem uma variação negativa e súbita de velocidade de 30 km/h ou mais (que acontece apenas em colisões; numa frenagem a desaceleração é gradual), os sensores promovem a deflagração das bolsas. Como dito anteriormente, todo esse processo dura cerca de 30 milésimos de segundo.

Airbags do Jaguar XF, deflagrados em acidente do jornalista Luís Perez - Luís Perez/UOL - Luís Perez/UOL
Airbags do Jaguar XF, deflagrados após acidente do jornalista Luís Perez
Imagem: Luís Perez/UOL
O jornalista Luís Perez, que recentemente sofreu um acidente com um Jaguar XF no autódromo de Interlagos (felizmente, sem qualquer gravidade), pôde atestar a eficiência do conjunto. "[Ele disparou] no exato momento da colisão, imediatamente quando o carro 'beijou' o muro", contou.

Mesmo com o avanço das tecnologias, o item ainda apresenta pontos fracos. Um deles é a chamada "zona cinzenta" de acionamento, encontrada no intervalo de variação entre 20 km/h e 30 km/h. Quando a mudança instantânea de velocidade fica entre esses dois níveis, o sensor pode ou não decidir pelo disparo, dependendo de sua leitura do caso. Abaixo de 20 km/h, o acionamento não acontece.

Módulo de airbag frontal cortado - Leonardo Felix/UOL - Leonardo Felix/UOL
Este módulo "fatiado" de airbag frontal do motorista mostra bem sua construção. Ele é formado por um gerador pirotécnico, que provoca a "explosão" do gás nitrogênio, e uma bolsa de poliamida, que resiste a temperaturas entre -35 e 85 graus Celsius. Disparo é feito a cerca de 300 km/h
Imagem: Leonardo Felix/UOL
TIPOS
Além dos airbags frontais, também já estão bem disseminados no mercado os laterais, de joelho e cortina. Algumas montadoras já desenvolvem outros tipos, como a bolsa externa para pedestres do Volvo V40, o airbag central da GM e o cinto de segurança inflável recentemente patenteado pela Ford, já anunciado para as atuais gerações do muscle Mustang e do crossover Edge.

O ponto mais vulnerável continua a ser a parte traseira. "Até há estudos nesse sentido, mas é um ponto muito difícil de se posicionar as bolsas de forma adequada. Creio que a melhor solução para os passageiros de trás acabe mesmo sendo o cinto inflável", prevê Schulze.