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Chevrolet Cobalt, ainda coadjuvante, faz motorista enxergar o mundo do avesso

Visual não é o forte (a cor escura deixa os faróis ainda maiores), mas interior agrada bastante - Divulgação
Visual não é o forte (a cor escura deixa os faróis ainda maiores), mas interior agrada bastante Imagem: Divulgação

Eugênio Augusto Brito

Do UOL, em São Paulo (SP)

19/12/2011 08h00

Dê uma volta pelas ruas, ligue a televisão, aumente o rádio, vire a página da revista e dê algumas cliques na internet. Vasculhe à vontade -- existe, mas ainda é raro encontrar o sedã Chevrolet Cobalt ao vivo ou mesmo em propagandas. UOL Carros testou o mais novo modelo da GM do Brasil durante sete dias e, neste período, avistou apenas uma outra unidade rodando -- ela também estava em poder de um jornalista especializado.

A procura em concessionárias da marca também é infrutífera: por telefone, quando avisadas do interesse pelo Cobalt, algumas deixam a chamada em espera até que a ligação caia ou você desista. Ao vivo, o carro sempre "acabou de ser vendido" ou existe apenas numa configuração diferente da solicitada. Após meses com enxurrada de flagrantes do carro em teste, sob disfarce, e passados 40 dias da apresentação oficial (releia aqui), por que é tão difícil encontrar um Cobalt?

RECALL DO PEDAL DO FREIO

  • Murilo Góes/UOL

    A Chevrolet divulgou nesta sexta-feira (16) nota nos principais jornais e veículos de comunicação do país informando os proprietários do sedã Cobalt sobre recall para substituição do pedal de freio.

    No total, 2.108 unidades fabricadas entre 17 de novembro e 10 de dezembro pode ter o defeito, que torna o pedal inoperante e impede o acionamento dos freios, podendo causar acidentes graves.

    O recall afeta os carros com número de série do chassi indo de CB163616 a CB216594.

    Segundo a GM do Brasil, 934 das unidades já foram emplacadas, sendo que 770 delas foram entregues a consumidores. O restante, faz parte da frota da própria Chevrolet. As outras 1.174 unidades fabricadas ainda não foram entregues às lojas.

    Os consumidores devem agendar o serviço de verificação e possível troca do pedal de freio nas lojas e oficinas autorizadas da Chevrolet em todo o país. Mais informações podem ser obtidas por meio do telefone do SAC, 0800-702-4200 ou através do site www.chevrolet.com.br.

Questionada sobre atrasos na fabricação ou mesmo da logística de entrega, a GM afirmou que tudo relacionado ao Cobalt seguia dentro do planejado. Nesta sexta-feira (16), porém, a marca divulgou um comunicado nos principais jornais do país informando sobre um problema com o pedal de freio do modelo, que pode causar acidentes e implica no recall obrigatório de mais de 2 mil unidades do sedã (saiba mais no quadro ao lado). A unidade guiada por UOL Carros não apresentou qualquer falha durante o período de testes. 

Outra justificativa para a o "sumiço" do Cobalt pode ser o sucesso do irmão maior Cruze, bom de vendas e de carisma. Lançado em setembro, o sedã médio planejado na Coreia do Sul e na Europa ainda está em seu período de maturação no Brasil, o que pode ter obrigado a fabricante a privilegiá-lo, em detrimento do Cobalt. Essa lógica é altamente plausível, sobretudo agora que os emplacamentos do Cruze se mostram em ascensão a ponto de fazê-lo encostar no líder Toyota Corolla, desbancando Honda Civic e Volkswagen Jetta, sensação que a Chevrolet não tinha há algum tempo. 

E, claro, há a questão da falta de "traquejo global" do Cobalt, que apesar de montado sobre uma plataforma internacional (ela também origina o Aveo/Sonic, hatch e sedã, por exemplo) não tem a grife de design mundial que faz do Cruze, do novo Malibu, além dos já citados Sonic hatch e sedã modelos visualmente aceitáveis.

Os traços definidos pelo centro latino-americano de design são pouco inspirados e fazem com que a identidade da Chevrolet -- faróis alongados em direção à cabine, grade frontal ampla e seccionada pela barra que carrega a gravatinha dourada -- resulte numa mistura de proporção inadequada. Embora não seja idêntica, a frente do Cobalt acaba confundindo muita gente, que o classifica como "sedã do Agile", e isso em tom jocoso, numa onda crescente de bullying (veja aqui).

VULNERÁVEL
Sobrou para o Cobalt o papel secundário, ao menos por enquanto. Com isso, o princípio de vida do sedã é claramente difícil: enquanto o Renault Logan entregou 1.102 unidades e o mexicano Nissan Versa emplacou 1.059, o Cobalt teve apenas 748 carros contabilizados pela Fenabrave (a entidade que reúne as concessionárias do país) na quinzena inicial de dezembro, primeiro período comercial comum aos três modelos rivais. Na curta vida útil do sedã, desde 17 de novembro, foram emplacadas apenas 934 unidades, segundo dados da própria Chevrolet. E destes, menos de 800 foram parar na mãos de compradores. É muito pouco para o mais recente filão do mercado, o de modelos feitos sob medida para atrair a visada classe C.

MELHOR POR DENTRO
A questão toda chega a ser curiosa. UOL Carros conviveu com um exemplar da configuração LTZ, a mais cara (R$ 45.980) e única disponível na frota que a Chevrolet disponibiliza para a imprensa. Após guiá-lo em ambiente real, fora das pistas fechadas de teste, uma vez que, podemos afirmar que, considerando virtudes e defeitos, o Cobalt mereceria sim mais vitrine. 

Durante o período de avaliação, rodamos cerca de 200 quilômetros a bordo do Cobalt por vias congestionadas e esburacadas, vagas apertadas e dias de chuva e de calor intenso. E a tranquilidade em muitos desses momentos foi maior até que a obtida dentro do Cruze, que apesar de vistoso se mostrou barulhento e beberrão. O Cobalt, ao contrário, foi silencioso o suficiente para permitir confidências aos sussurros entre seus ocupantes, graças sobretudo ao melhor isolamento entre o cofre do motor e a cabine -- sob chuva forte, percebe-se que o revestimento é menos generoso em outros pontos, sobretudo no teto, que deixa passar um pouco mais de ruídos do mundo exterior. O consumo, no entanto, foi animador todo o tempo, chegando à média de 12 km/l na estrada e quase 9 km/l no trânsito quase parado do final de ano dentro da cidade, sempre com etanol no tanque.

Os números acima mostram que o motor 1.4 Econoflex e o câmbio de cinco marchas F17-5CR, apesar de jurássicos, foram bem calibrados para trabalhar com os 1.072 quilos do Cobalt. A alavanca de câmbio, aliás, é uma das mais precisas jamais encontradas num Chevrolet --  e até março de 2012, haverá a opção de caixa automática de seis marchas usada no Cruze e no Captiva deve ser acoplada ao motor 1.8 Econoflex (também o antigo, não o atual Ecotec do Cruze), numa nova versão topo do Cobalt. O sistema de freios também se mostrou bastante eficiente quando requisitado, apesar de contar com tambores nas rodas traseiras e discos apenas nas dianteiras -- a exemplo, aliás, do "melhor sedã do mundo" Hyundai Elantra.  

O conforto interno do Cobalt também vem da suspensão, ponto sensível de muitos modelos da Chevrolet, mas que ao menos durante os sete dias se mostrou melhor adaptada ao solo maltratado de nossas ruas, deixando passar pouco da irregularidade para o bumbum dos ocupantes. Falando em bumbum, este também recebe bons tratos dos assentos, que fogem da moda atual de fazer bancos com almofadas curtas demais -- o único porém fica para o encosto, que poderia se moldar melhor às costas, bem como à ausência de opção do revestimento além do tecido aveludado. Cabeças e joelhos, porém, contam com espaço suficiente para não encostarem nas paredes e teto do carro, nem em cabeças e joelhos de outrem.

De fato, esta é a tônica do ambiente interno do sedã: não há diversificação, nada é vistoso a ponto de saltar aos olhos ou ao tato, mas tudo é trabalhado e arrematado de forma primorosa. O grosso do revestimento é de plástico, mas ele é bem encaixado (como poucas vezes vimos em carros da Chevrolet) e de textura interessante. No miolo das portas, há ainda uma faixa do mesmo tecido aveludado dos bancos, quebrando um pouco a rigidez plástica. O principal, no entanto, é que não há aquela falsa sensação de conteúdo do Agile, por exemplo, onde diferentes tons de pintura tentam mascarar o fato da péssima qualidade do revestimento. O Cobalt é sóbrio e correto.

  • Sobriedade descartada na frente se faz presente no restante do conjunto -- dois ressaltos que convergem para a coluna B (entre as portas) são o auge do estilo na lateral, enquanto um friso cromado demarcando o suporte de placa é o ponto que mais chama a atenção na traseira

Deslizes são encontrados: a abertura de nichos sem tampa no painel principal empobrecem o ambiente, assim como a ausência de controles automáticos e/ou digitais para os faróis e controle do ar-condicionado, por exemplo (de novo, pode-se fazer a comparação com o Agile, que é mais simples, mas possui tais itens).

E há o curioso caso do item desaparecido: os sensores de estacionamento, a nosso ver fundamentais em qualquer carro, sobretudo em sedãs e veículos que impossibilitam boa visibilidade traseira, eram itens de série da versão LTZ testada durante o lançamento do Cobalt em novembro. O carro avaliado agora, porém, não tinha o sistema, que também não é encontrado na descrição de equipamentos disponível no site da marca (veja aqui).

Ainda assim, a contabilidade final aponta mais pontos de valorização do que de vergonha. Visto de dentro para fora, o Cobalt oferece mais e, portanto, merece mais atenção do que tem atualmente.