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Vídeos sangrentos europeus se opõem a campanhas de trânsito "limpas" do Brasil

EUGÊNIO AUGUSTO BRITO

Da Redação

06/04/2011 21h13Atualizada em 07/04/2011 10h16

Os dados sobre acidentes de trânsito no Brasil indicam uma realidade alarmante, que cria um funesto exército de feridos, mutilados e mortos. Só a cidade de São Paulo contou 32.035 vítimas em 2009, último ano com levantamento completo da CET (Companhia de Engrenharia de Trânsito), com total de 1.382 mortos (confira a reportagem completa aqui). No último Carnaval, segundo relatório da Polícia Rodoviária Federal, foram 4.165 acidentes, com 213 vítimas fatais nas rodoviais que cortam o Brasil, salto superior a 27% em relação a 2010.

  • Reprodução

    Acima, campanha de conscientização tradicional no Brasil, contrastando com método mais apelativo, utilizado pela comunidade de Salinas (PA), abaixo.

  • Antônio M.Rocha/UOL Mais

Após cada levantamento divulgado, culpados são procurados, projetos de lei são debatidos e tudo e todos -- de motoristas imprudentes ou inexperientes a veículos possantes demais -- passam pelo crivo da opinião pública. Na direção oposta, campanhas de trânsito são criadas e o tema de todas, quase que invariavelmente, é o da conscientização através de imagens positivas, bordões pretensamente inteligentes e textos que buscam incentivar boas ações de quem está ao volante.

No sistema viário Anchieta-Imigrantes, que liga São Paulo e municípios do ABC Paulista à Baixada Santista, outdoors ostentam frases como “Obrigado por não beber e dirigir” ao lado de fotos de crianças. Na cidade do Rio de Janeiro, em 2008, o desenho de uma fruta completava cartazes da campanha da CET local, que pregava "Falta de educação no trânsito é um abacaxi para a cidade". Em Santa Catarina, animações e peças estáticas criadas a pedido da RIC, afiliada da emissora de televisão Record, transmutam arquétipos de motoristas irresponsáveis em personagens pitorescos, que se envolvem em acidentes, mas seguem a boa regra do desenho e não se ferem, nem morrem. Tudo bastante asséptico.

Na Europa, porém, uma onda sangrenta atingiu as chamadas campanhas institucionais nos últimos anos. O caso mais célebre é o do vídeo abaixo:

ATENÇÃO: OS VÍDEOS ABAIXO INCLUEM CENAS FORTES, COM SIMULAÇÃO DE FERIMENTOS E SANGUE

Criado em 2008 a pedido da Polícia de Gwent, no País de Gales, conta a história ficcional de Cassie Cowan, de 17 anos, que se distrai ao volante com a troca de mensagens de texto (SMS) por celular. A imprudência resulta em acidente, que envolve as duas amigas e outros dois carros. Tudo é mostrado de modo realista, com objetivo explícito de chocar o espectador. No Reino Unido, a prática de mandar torpedos enquanto se dirige foi declarada ilegal em 2006, já que reduz as chances de reação do condutor em 35% (impacto maior que o causado por álcool e drogas, segundo estudos britânicos), mas os índices de acidentes por este motivo não diminuíram.

A campanha fez tanto sucesso que ganhou versão estendida da rede BBC, foi veiculado em todo Reino Unido, estampou manchetes de jornais e revistas importantes na Europa e nos Estados Unidos e virou hit na internet, alcançando outras localidades. De clique em clique, já foi visto cerca de 10 milhões de vezes em países da América do Sul e bombou também no Brasil.

A empreitada deu frutos também na República Checa, onde o Ministério do Transporte transformou o tema "Quem não tem consciência, paga caro" ("Nemyslíš, Zaplatíš" no original) em mote para vídeos curtos, mas intensos, que só podem ser exibidos após as 22h, mas já estão no ar há dois anos e ganharam até perfil no Facebook: todos reproduzem mortes violentas causadas por barbeiragens -- excesso de velocidade, ultrapassagem em ponto proibido, uso do celular ao volante (ainda que com equipamento handsfree), transporte de crianças e bebês fora dos dispositivos de segurança (cadeirinhas) e uso de bebida e tóxicos antes de dirigir. Ao final, o responsável vai para o cemitério junto com outras vítimas de trânsito, para a cadeia ou para o hospício.

A onda hiperrealista não chegou ao Brasil, mas a comunidade de Salinas, no Pará, espalhou cartazes provocativos pelas estradas da região com dizeres como "Bebeu e está dirigindo? Chique, hein? Se o carro pegar fogo, vai ser cremado" ou ainda "... Desculpe a intimidade, mas a viúva é bonita?" (veja aqui).

Ainda não há dados mostrando maior eficácia de campanhas realistas quando comparadas a peças com discursos leves e bem-humorados, mas não há dúvida quanto ao alto poder de atração das primeiras. E você, o que acha? Deixe seu comentário.