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Existem motos feias, ou são apenas incompreendidas?

Cícero Lima

Colaboração para o UOL

26/07/2013 21h36

O poeta Vinicius de Moraes ganhou o ódio de muita gente, principalmente de feministas, ao publicar o poema "Receita de Mulher". Nos primeiros versos, afirma: "As muito feias que me perdoem, mas beleza é fundamental".

A revista "Duas Rodas" chegou a dizer, no texto de uma avaliação, que a Suzuki 750F "parece a Mônica" por conta do desenho do conjunto óptico, que lembrava os olhos esbugalhados da personagem de Maurício de Sousa. Foi o que bastou para proprietários ofendidos inundarem a redação com reclamações cheias de ódio.

Cá entre nós, por vezes os engenheiros da indústria de motos parecem brincar com o gosto dos clientes ao desenvolverem modelos de estilo duvidoso. Veja bem, não digo que estas motos sejam feias. Na verdade, podem ser modelos arrojados, e até certo ponto incompreendidos.

PONDO A MESA
Uma fábrica que sempre apostou na... incompreensão de suas motos é a Yamaha. Não faltam modelos para exemplificar a opção, seja a potente V-Max ou a forte MT-01. Porém, em meio a essa ousadia, a resposta do público nem sempre correspondeu à expectativa da marca, principalmente no Brasil. Um exemplo por aqui foi a Yamaha TDR 180. É uma moto feia ou bonita?

Os números de venda da TDR 180 mostram que, para o povo, era uma moto feia. Lançada no fim de 1988, ficou em linha até 1991 e vendeu pouco mais de 11 mil unidades. No mesmo período, a trail conservadora DT 180 foi a escolhida por quase 30 mil motociclistas.

Recentemente, a casa de Hamamatsu experimentou outra decepção, desta vez com a naked MT-03. Lançada em fevereiro de 2008, o modelo vendeu apenas 2.600 unidades e saiu de linha. Uma pena.

Outras grandes marcas também sentiram o veneno da indiferença dos compradores. Até mesmo a poderosa Honda já amargou prejuízos com alguns lançamentos. Um exemplo foi o scooter Spacy 125, que vendeu pouco mais de 2.200 unidades entre 1993 e 1994.

FALE DE MIM
Longe de se tornarem populares, devido ao custo elevado, alguns modelos são conhecidos pela capacidade em gerar discussão. Um deles foi o símbolo de ascensão social: BMW K. O modelo trazia linhas futuristas e um motor de quatro cilindros em linha com a potência máxima de 100 cv. Tudo de gosto duvidoso. Ficou conhecida, principalmente, como a moto do "playboy" Chiquinho Scarpa, que com ela desfilava pelas ruas de São Paulo nos anos 1990.

Outro modelo da marca alemã que gerou discussão foi a R 1200 CL. Dona de linhas voluptuosas, a touring não agradou aos fãs da marca e ver uma na rua é raridade. Motivo? Talvez por ter um avantajado escudo frontal que a deixava com cara de Harley-Davidson...

A escola italiana de design também criou modelos à frente do seu tempo e menos populares. Um exemplo é a Aprilia Motó. O modelo de 650 cc gerou discussão quando chegou, porém a representação da marca teve vida curta no país, assim como o modelo, raro nos dias de hoje. Outras italianas da mesma estirpe também estamparam as capas de revistas especializadas, caso de Cagiva Roadster 200 ou a Moto Guzzi Quota.

Não importa se o modelo seja destinado ao público de menor poder aquisitivo ou aos abastados. O motociclista brasileiro não perdoa o fato de a moto ser diferente -- para não dizer feia. Pelo menos é o que mostram os números de vendas. Segue à risca o que seguia dizendo Vinicius de Moraes, no poema que abriu este texto: "Não há meio-termo possível. É preciso que tudo isso seja belo".

Cícero Lima é especialista em motocicletas