Trânsito caótico da Índia conta com 80 milhões de motos

Da Infomoto

Em Bangalore (Índia)*

"Há 30 anos a Índia era subdesenvolvida. Hoje é o país que tem atraído investimentos de todas as partes de mundo e, dessa forma, a economia não para de crescer", disse Venu Srinivasan, presidente da TVS Motor, sexta maior fabricante de motocicletas do mundo. A afirmação aconteceu durante coquetel a jornalistas brasileiros, no final de fevereiro, num dos hotéis mais sofisticados de Bangalore, metrópole localizada na região sul da Índia. Só para se ter uma idéia da força produtiva do mercado indiano, as sete fabricantes hoje estabelecidas no país produzem juntas 10 milhões de motocicletas por ano. A Índia só perde o posto de maior fabricante do planeta para a China, com 15 milhões de motos/ano.  

  • Aldo Tizzani/Infomoto

    Motociclistas da Índia não têm a cultura do corredor e são surpreendentemente calmos

Segundo o presidente da TVS, dois fatores foram fundamentais para este crescimento: "A determinação do povo, além da injeção de capital em vários setores da economia, principalmente na educação e em tecnologia de ponta", diz Srinivasan. Quase um continente, a Índia tem 3,3 milhões de km² e mais de 1,2 bilhão de habitantes. Em função dos números superlativos, o país é um dos maiores mercados consumidores do mundo. Nas grandes cidades -- como, por exemplo, Bangalore e a capital Nova Déli -- a motocicleta é usada como um dos principais meios de transporte. É fácil encontrar nas ruas motos com três ou até quatro ocupantes. Na Índia são produzidas e vendidas mais motos que automóveis e comerciais leves, que, somados representam apenas três milhões de unidades.

Como a ampliação da malha viária está diretamente ligada ao crescimento econômico da Índia, o trânsito dos grandes centros indianos não fica devendo em nada ao de São Paulo. Num verdadeiro canteiro de obras a céu aberto, nas ruas e avenidas os carros, motos, ônibus, caminhões e os populares riquixás (veículo de três rodas que transporta passageiros) vão literalmente se acotovelando em busca de espaço. Não importa o lado que se escolha: direita ou esquerda.

Por mais incrível que pareça, há pouquíssimos acidentes, e o trânsito flui com a ajuda da deus Shiva, uma das maiores divindades do hinduísmo. Até porque os motociclistas ainda não formaram a cultura do corredor. Por exemplo, todo tipo de veículo vai se moldando ao fluxo, e quase se esbarram nesta luta pelo espaço.

Em Bangalore, considerada um dos principais pólos industriais da Índia, ninguém toma conhecimento da lei da física que diz que "dois corpos não podem ocupar mesmo espaço". Além disso, o ritmo da tocada é outro: as motos rodam no máximo a 40 km/h. Ninguém xinga ninguém, muito menos faz gestos obscenos. Na "republica da buzina", o som contínuo chega até a irritar. Porém, uma das principais características do povo indiano é a tranqüilidade para atuar em determinadas situações, inclusive as de estresse nível máximo. Outra coisa que deixa os estrangeiros assustados é a adoção do sistema de condução inglês, na qual o volante fica na direita. Ns ruas e estradas, a faixa expressa é a interna (direita).

CAPACETE 
Os motociclistas indianos são tão tranqüilos que até se esquecem de usar o capacete. Assim como no Brasil, na Índia a lei obriga o uso do equipamento de segurança, porém a norma parece ser facultativa. Ou seja, os indianos precisam criar o hábito e formar sua cultura de segurança sobre duas rodas. Detalhe: o garupa também raramente usa o capacete; muitos preferem uma simples bandana para se "proteger".  

  • Aldo Tizzani/Infomoto

    Uso do capacete é negligenciado, e motos servem para transportar qualquer coisa

Há outras curiosidades: os homens da religião sikh (2% da população) são isentos por lei de usar capacetes. Mas você sabe como reconhecer um motociclista sikh? É só reparar nos turbantes que ostentam nas cabeças. Para Ragvinder Sing Rekhi (ele é sikh), consultor da TVS, o turbante identifica os integrantes da religião, mas na estrada o uso do capacete é uma questão de segurança. "E a religião nos ensina que devemos cuidar de nossa integridade física. A religião, como o homem, tem de evoluir com o tempo", explica Rekhi, indiano que fala o português perfeitamente.

Outro detalhe importante: as mulheres que usam sari (tecido de quase três metros, que enrolado no corpo forma uma espécie de vestido) sentam de lado na moto. Não passam a perna sobre o banco. Para isso, os fabricantes instalaram pedaleiras -- posicionadas no lado esquerdo da moto -- e protetores especiais contra queimaduras.

QUALIDADE E MERCADOS
Para ampliar sua participação no mercado internacional, os fabricantes indianos, como a TVS, que deverá produzir 1.600 unidades até o final de 2010, precisam fazer a lição de casa. Além da dedicação e determinação, é indispensável investir cada vez mais na qualidade, na durabilidade e no design se seus produtos. "E é isso justamente que estamos fazendo. Nosso grande desafio é ampliar nossa participação no mercado internacional, reduzir consumo e nível de emissões, diminuindo o peso e baixando o custo final do modelo", disse Harne Vinay Chandrakant, presidente do setor de desenvolvimento e novos produtos da TVS, afirmando que há mais de 500 engenheiros na empresa trabalhando em pesquisa e no desenvolvimento de novos modelos de motocicletas.

A empresa indiana assinou uma parceria com a Dafra, marca brasileira de motocicletas, que vai comercializar produtos da TVS no Brasil. O primeiro modelo da parceria deve chegar ainda no primeiro trimestre.

Por outro lado, o Brasil tem muito a ensinar sobre como satisfazer o consumidor, que a cada dia está mais exigente com relação ao padrão de qualidade e nível de acabamento dos modelos comercializados no país. Segundo o presidente da Dafra Motos, Creso Franco, todos têm um grande desafio pela frente: "O de transformar a motocicleta num veículo popular, que realmente atenda às necessidades de mobilidade dos motociclistas". Creso diz que, em função da renda per capita do brasileiro, a aquisição mais natural ao "subir de vida" seria uma moto. "Por isso tenho certeza que, em 2010, haverá uma recuperação do mercado de duas rodas. E em breve as motos superarão os carros em números absolutos de vendas", aposta o presidente da Dafra.

Só por curiosidade: o Brasil tem hoje uma frota circulante de motocicletas de cerca de 14 milhões de unidades, contra 80 milhões de motos na Índia.

*Viagem feita a convite da Dafra Motos

 

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