Projeto que proíbe moto no corredor gera polêmica entre usuários e especialistas

Da Infomoto

  • Renato Durães/Infomoto

Pensando em preservar a integridade física do motociclista e, consequentemente, diminuir o número de acidentes, a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania) aprovou em 7 de abril, em caráter conclusivo, o Projeto de Lei 2.650/03, que altera o Código de Trânsito Brasileiro e proíbe os motociclistas de trafegar nos corredores entre veículos. Agora a proposta segue para análise do Senado, onde será discutida a aprovação final, antes do encaminhamento ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

De autoria do deputado Marcelo Guimarães Filho (PMDB-BA), o projeto determina que o motociclista deverá observar a distância lateral de 1,5 metro dos carros em circulação. Assim, a medida inviabiliza o hábito dos motociclistas de seguir pelos corredores formados entre carros no caso de congestionamentos. Mas há estatísticas que concluem que a maioria dos acidentes de com motociclistas acontece nos cruzamentos e não nos corredores.

Polêmico, o projeto retoma a redação original do Código de Trânsito sobre motocicletas, vetada pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, sob a alegação de que a prática é largamente utilizada em todo o mundo. Agora, o relator da proposta na CCJ, deputado Hugo Leal (PSC-RJ), assinalou que o próprio código estabelece como diretriz "o trânsito em condições seguras", e que a proibição é condizente com esse princípio.

PRÓS E CONTRAS
Se aprovada pelo Senado e sancionado pelo presidente Lula, a nova lei será bastante impopular entre os motociclistas. Sinônimo de agilidade, a moto foi incorporada ao modo de vida dos grandes centros. Para muitos motociclistas, circular no corredor é a única solução para escapar do trânsito carregado das metrópoles e conseguir chegar na hora certa ao seu destino.

Assim, o motociclista profissional -- o motoboy -- é considerado o grande vilão do trânsito. Claro que alguns representantes da categoria são abusados e muitas vezes inconsequentes e irresponsáveis -- muitos, porém, trabalham sobre a pressão do cronômetro. Ou seja, tem a missão de fazer o maior número de entregas possíveis no mesmo dia. Mas a história está mal contada.

Segundo dados da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego da Cidade de São Paulo), dos 380 acidentes fatais envolvendo motociclistas na cidade em 2006, em apenas 23% dos casos as vítimas atuavam na atividade de entregas rápidas. Em 2008 esse número caiu para 14%. Ou seja, a grande maioria dos mortos no trânsito da capital paulista era de pessoas que utilizam a moto apenas como meio de transporte.

Contrário ao projeto de lei, Lucas Pimentel, presidente da Abram (Associação Brasileira de Motociclistas), diz que o mais sensato seria a criação de um divisor de faixa de rolagem diferenciado entre a faixa 1 e 2, a fim de regulamentar a passagem das motocicletas e proibir a passagem das motos entre as demais faixas.

"Nossa preocupação não é com a fluidez, mas sim com a segurança do motociclista. Muitos acidentes acontecem pela mudança repentina de faixa por parte dos carros. Muitos motoristas desatentos ou irresponsáveis nem olham nos espelhos retrovisores. Além disso, o tempo de frenagem do carro é totalmente diferente se compararmos com a motocicleta. A colisão traseira será inevitável, se as motos forem obrigadas a andarem atrás dos carros", conta o presidente da Abram, prevendo uma carnificina caso seja proibida a passagem da motocicleta pelo corredor.

"COMOÇÃO SOCIAL"
Há 38 anos usando a moto diariamente como meio de transporte, o executivo Nicolás Lagomarsino faz coro com Lucas Pimentel. "Sou totalmente contra a eventual proibição da circulação de motos nos corredores", conta o piloto, dizendo que a motocicleta é um veículo econômico, menos poluente e mais racional do que um automóvel. Portanto, seu uso deveria ser incentivado e não restringido. "Querer que as motos ocupem o mesmo espaço de um carro é surreal nas condições das grandes cidades brasileiras. Teoricamente, se as motos fossem proibidas de circular nos corredores e se respeitassem essa proibição, o trânsito se tornaria ainda pior. A cidade seria paralisada, pois isso equivaleria a acrescentar milhares de veículos a uma cidade já tão sobrecarregada", conclui Lagomarsino.

O executivo também faz uma análise socioeconômica se a lei passar pelo Senado e for sancionada pelo presidente Lula. "O transporte em moto e o serviço de moto frete perderiam o sentido. Dezenas de milhares de pessoas ficariam sem atividade, causando uma comoção social. Além disso, sem a moto, não existiriam entregas rápidas (muitas vezes de medicamentos), os bancos não conseguiriam operacionalizar seus serviços, publicações não poderiam ser feitas a tempo, enfim, uma enormidade de serviços que a população utiliza não seria mais possível de ser realizada. Isso sem falar na impopularidade da medida", prevê.

Seguindo a linha de raciocínio de Pimentel e Lagomarsino, o presidente do Sindicato dos Mensageiros Motociclistas, Ciclistas e Mototaxistas do Estado de São Paulo (Sindimoto), Gilberto Almeida dos Santos, afirma que o projeto é arbitrário e ignora as verdadeiras ameaças à segurança dos motoristas. "O problema dos acidentes não está no tráfego de motos entre veículos, mas sim pela falta de educação dos condutores de forma geral", explica.

O sindicalista ainda questiona: "Como é possível, em um trânsito como o de São Paulo, por exemplo, discriminar o motociclista, impondo uma restrição absurda, tendo em vista a versatilidade do veículo de duas rodas, ferramenta importantíssima para ajudar a desafogar o trânsito?"

Em entrevista ao telejornal matinal Bom Dia Brasil, da "Rede Globo", o professor David Duarte, da UnB (Universidade de Brasília), disse ser favorável ao projeto de lei. Segundo o doutor em segurança de trânsito, o país gasta entre R$ 7 bilhões e R$ 8 bilhões só com acidentes de motos. "O número de motocicletas aumenta a cada ano e o número de mortos e feridos também", afirma Duarte, dizendo que além da aprovação da nova lei, é preciso aumentar a fiscalização sobre a motocicleta e seu condutor.

Polêmicas à parte, todos concordam que o governo e a indústria de duas rodas devem promover campanhas educativas e de uso racional da motocicleta, além de investir em sinalização e fiscalização. A outra grande preocupação é investir em uma melhor formação e também na educação dos novos motociclistas e motoristas para que haja um convívio pacífico entre as partes.
(por Aldo Tizzani)

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