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Salão mostra que "carro do futuro" vai demorar para chegar

Eugênio Augusto Brito

Do UOL, em Paris (França)

01/10/2014 21h39

É inevitável o déjà vu ao folhear as edições dos franceses "Le Monde", "Le Figaro" e "La Tribune" que antecipam a abertura do Salão de Paris. Segundo os impressos, o maior evento automotivo do ano, que abre as portas à imprensa especializada nesta quinta-feira (2) e ao público em geral no sábado (4), promete mostrar que os carros "do amanhã" serão autônomos, mais ecológicos e mais conectados.

Tais promessas, porém, já foram vistas e são repetidas a cada novo salão. O diferencial agora está na percepção mais pé no chão: ainda que conceitos e modelos que parecem prontos para circular nas ruas (ao menos aqui da Europa) sejam apresentados, sabe-se que dificilmente algum deles chegará de fato às garagens antes de 2018.

Citroën C4 Cactus AirFlow 2L - AFP - AFP
Citroën C4 Cactus AirFlow 2L, conceitual, é mostrado pela PSA, em Paris
Imagem: AFP
Difícil será conciliar o chamado buzz -- a primeira aparição na mídia, discussão pública, apresentação real, chegada às lojas e o ato de compra das primeiras unidades --  com a necessidade que as marcas tem de vender, e vender agora.

FEBRE FRANCESA
Carros autônomos não são mais novidade, pelo menos não o conceito. Mercedes-Benz, Volvo, Audi, Lexus, BMW, Ford, universidades brasileiras e até o gigante da informática Google estão desenvolvendo tecnologias, que devem entregar os primeiros modelos capazes de se guiar sem intervenção do condutor (ou seja, do ser humano) a partir de 2020. UOL Carros fez até uma série especial de reportagens sobre o assunto.

A questão é dizer quando a tecnologia estará disseminada e acessível. Alguns especialistas acreditam que não antes de 2070.

Os chamados modelos conectados estão mais próximos: no Brasil, é possível encontrar versões de carros de entrada de algumas marcas (como Chevrolet Onix, o novo Ford Ka e Nissan March) que utilizam o conceito de apps e de conexão simples com o celular para fornecer serviços como web rádios e navegação por GPS mais precisa. Novamente, a questão principal acaba sendo outra: dizer quando carros poderão se guiar totalmente através da rede global de computadores, indicando online suas rotas e recebendo informações de servidores de todo o mundo.

Por fim, o terceiro tópico indicado pelos jornais franceses parece ser o mais promissor -- por mexer com o bolso de todo motorista: as caseiras PSA (Peugeot e Citroën) e Renault, além de algumas estrangeiras, prometem pesar a mão no tema autonomia. Peugeot 208 2L e Citroën C4 Cactus Airflow 2L prometem, como o nome indica, gastar apenas 2 litros de combustível, no caso diesel, para percorrer até 100 quilômetros de estrada. Nos dois casos, a façanha se dá com o uso de motores menores (3-cilindros) integrados a compressores de ar que também movimentam as rodas (uma solução híbrida, portanto, ainda que não com o habitual uso de eletricidade).

É bastante, já que a melhor média dos modelos atuais movidos a diesel não passa de 4 litros a cada 100 km. Traduzindo para a realidade brasileira, seria como como saltar de 25 km/l para 50 km/l. Pena que o uso do diesel seja proibido para veículos de passeio em nosso país...

Bastante, mas não o máximo. Voa mais alto a Renault, que vai mostrar o hatch compacto Eolab. Com tamanho equivalente ao do europeu Clio 4, mas visual muitíssimo mais instigante, o Eolab promete gastar apenas 1 litro de diesel para rodar os mesmos 100 km; a conta é esta mesmo: 100 km/l. Neste caso, a chave do sucesso está no sistema híbrido, com dois motores elétricos, e na redução extrema de peso: o modelo é cerca de 400 quilos mais leve que um modelo normal equivalente. O problema está no uso extensivo de materiais nobres (alumínio e fibra de carbono) e seu preço final.

Fossem comercializados atualmente, estima-se, nenhum destes carros sairia das lojas por menos de 30 mil euros (quase R$ 95 mil), valor salgadíssimo para a realidade do primeiro mundo (o objetivo, porém, é reduzir também o custo pela metade e chegar à realidade dos 15 mil euros). Não à toa, estudos atuais apontam que apenas 0,9% dos carros serão elétricos até 2018, ainda que a frota de híbridos tenda a se expandir. E nenhum, zero, serão autônomos (lembre-se, o ano-chave é 2020). Ainda assim, espera-se que até lá existam 420 milhões de unidades conectadas à internet de alguma forma. E tudo começa nesta quinta-feira.