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Carros "escutam mal" e irritam clientes nos EUA; Ford e VW buscam solução

Keith Naughton

Da Bloomberg, em Detroit (EUA)

08/09/2014 19h03

Colin e Rachel Britton têm um problema de comunicação quando entram em seu Mercedes GL500 de US$ 95 mil (cerca de R$ 215 mil, sem impostos, taxas e outros custos). Não entre eles, mas com o carro. O sistema de reconhecimento de voz se confunde com o sotaque britânico do casal, especialmente o de Rachel.

"O carro simplesmente não entende", disse Colin Britton, um executivo de software que mora em Lexington, Massachusetts. Sua esposa tenta enganar o sistema com um sotaque do sul dos EUA, o que faz ele e seus três filhos adolescentes gargalharem e também deixa o sistema desconcertado. "Nós achamos isso muito engraçado".

Ford New Fiesta Sync - Divulgação - Divulgação
Ford universalizou sistema multimídia Sync, que reconhece comandos de voz do condutor; ferramente está presente em praticamente toda a linha, do novo Ka (feito no Brasil) ao Mustang 2015 (que ainda será lançado globalmente).
Imagem: Divulgação

A maioria dos motoristas, porém, não acha graça. Eles estão exigindo como nunca a capacidade de conversar com seus automóveis para poderem telefonar ou inserir destinos em sistemas de navegação. O que está impulsionando o desejo de conversar com o carro é o aumento do uso de smartphones, que são muito bons para obedecer a comandos de voz.

Eis o problema: os carros não são tão inteligentes. As falhas do controle por voz são a principal reclamação dos proprietários de carros novos, segundo a J.D. Power Associates, que acaba de reprovar as tentativas das companhias de fazerem os veículos conversarem -- e escutarem.

O setor está trabalhando obstinadamente nas respostas porque o reconhecimento de voz é o próximo campo de batalha automotivo. Com a estimativa de que as vendas de automóveis nos EUA atingirão 16,3 milhões de unidades, a maior alta em oito anos, fabricantes como a Ford e a Volkswagen estão correndo para consertar o problema. O reconhecimento de voz é o assunto mais quente da semana em uma reunião sobre transporte inteligente em Detroit, na qual o presidente do conselho da Ford, Bill Ford, dará palestra.

"Você tem esse carro altamente sofisticado, que opera maravilhosamente bem, é super confortável e tem um belo visual, mas cujos comandos de voz não funcionam corretamente", disse Jack Nerad, analista sênior da Kelley Blue Book. "Isso pode estragar a experiência como um todo -- a ponto de tornar o carro invendável".

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DICIONÁRIO
As empresas estão melhorando a qualidade sonora dos microfones e fazendo testes com sua localização; a maioria deles atualmente fica embutida no teto, no espelho retrovisor e no assento do motorista. O banco de dados com palavras estão sendo expandidos para terem mais do que as 2 milhões de termos dos sistemas mais recentes, número maior que o de apenas 500.000 palavras de alguns anos atrás, disse Arnd Weil, vice-presidente da Nuance Automotive, uma fornecedora de sistemas de voz para grandes fabricantes, incluindo Ford, General Motors Co. e Chrysler Group LLC.

A maior inovação pode ser a adoção do chamado reconhecimento de discurso natural, comum em smartphones e já introduzido na linha de modelos Cadillac da GM. Em vez de ter dificuldades com uma troca de palavras robótica e tediosa para passar a mensagem, esses sistemas compreendem a linguagem coloquial, reconhecendo palavras-chaves e agindo com base nelas. "Você conversa como conversaria com um humano", disse Weil. "Você diz 'vamos para o escritório' e o sistema entende".

O Siri chegará aos painéis dos carros no fim deste ano quando a Apple lançar sua plataforma CarPlay, que apresenta uma versão de um aplicativo para iPhone que pode ser operado por voz ou por toque. Honda, Mercedes-Benz, Ferrari e a Volvo Cars disseram que planejam colocá-la em seus carros.

O Android Auto, do Google, também poderá ser acessado por uma tela no painel. O Google está desenvolvendo produtos por meio da Aliança Automotiva Aberta, uma parceria com grandes fabricantes de veículos como GM, Ford, Chrysler, Honda, Hyundai, Volkswagen e Nissan Motor Co. A parceria representa uma mudança em relação à cautela que essas empresas antes mostravam para entregar o controle do painel a empresas de tecnologia.

Ainda existem riscos, segundo a AAA Foundation for Traffic Safety (Fundação por um Trânsito Seguro, em tradução livre). No ano passado, a entidade encomendou um estudo que apontou que as conversas telefônicas com mãos livres ao dirigir quadruplicam o risco de acidente de trânsito e não distraem menos do que manter o telefone na orelha.

A fundação pede que a indústria automotiva instale travas para evitar que os motoristas usem redes sociais quando o veículo estiver em movimento. Algumas fabricantes, como a Chrysler, desenvolveram seus sistemas com proibições. "Podemos esperar para atualizar o Facebook quando estivermos estacionados", disse Jake Nelson, diretor para segurança no trânsito e pesquisa da organização.