Topo

Toledo (EUA) antecipa como será fábrica do Jeep Renegade no Brasil

Eugênio Augusto Brito

Do UOL, em Toledo (EUA)

09/07/2014 16h37

UOL Carros visitou recentemente a unidade do grupo Fiat-Chrysler em Toledo, no Estado americano de Ohio (cruzando a divisa estadual, o local fica a menos de duas horas do QG do grupo em Detroit, Michigan), complexo que concentra fábricas de utilitários Jeep. Importante para a história da Chrysler nos Estados Unidos, Toledo também começa a criar laços fortes com o Brasil: daqui sai, além do Jeep Wrangler, a nova geração do SUV médio Cherokee, que chegará com seu jeito diferentão ao Brasil em setembro. Além disso, Toledo pode ser considerada "fábrica-irmã" da unidade que a Jeep monta (em conjunto com a Fiat) em Goiana, Pernambuco, e que abrirá sua linha de produção no começo de 2015.

No Brasil, serão produzidos o inédito e fundamental Jeep Renegade, SUV compacto que terá a missão de alavancar a marca em diferentes mercados, além do substituto do Compass (um modelo urbano, portanto) e de uma picape média da Fiat, "convidada" dentro da estrutura.

Conforme UOL Carros antecipou, a fábrica no Brasil terá capacidade de produção estimada em 250 mil carros/ano quando a produção estiver plena. Será ainda a primeira unidade da marca Jeep fora do território norte-americano e por um bom tempo -- o complexo que está sendo erguido na China só fica pronto em 2016.

Goiana será, portanto, fundamental para os planos da Fiat-Chrysler e, mais propriamente, da Jeep. Mas será, sobretudo, uma fábrica com tecnologia fabril de ponta, muito similar à estrutura encontrada em Toledo. É isso o que a visita à unidade americana e também informações recebidas de pessoas ligadas ao grupo nos permitem afirmar: "A fábrica de Pernambuco já nasce como uma das mais modernas do grupo e terá muito do que é visto em Toledo, sobretudo na organização, uso de robôs, laboratórios e tecnologias", relatou uma fonte.

PASSADO E FUTURO
O complexo da Chrysler é praticamente uma mini-cidade dentro da cidade de Toledo. Galpões, pátios e outras estruturas se espalham pelo horizonte a perder de vista -- tudo grandioso. São quase 4 milhões de metros quadrados apenas para a área principal, que abriga um total de 4.100 trabalhadores.

Na entrada principal, o estacionamento de funcionários é do tamanho de grandes shopping-centers brasileiros e quem tem carro da Chrysler para mais perto (colados ao portão, porém, apenas os carros para deficientes físicos, independente da marca). Daí para dentro, é possível ver uma escultura gigante com o logo da Jeep, um memorial para os veteranos da 2ª Guerra (numa ligação intrínseca com a Jeep e com esta unidade da qual falaremos abaixo) e, claro, um mastro com a bandeira americana hasteada.

Toledo fabricava bicicletas no nascer do século 20, depois equipamentos industriais, quando, em 1941, o exército americano fez a licitação para a fabricação de um veículo de transporte de tropas robusto. Nascia ali o modelo de uso geral (general purpose, GP, ou, na corruptela da língua, "jeep") da Willys-Overland -- daí o memorial de guerra na porta da fábrica. Na década de 1960, o lugar começou a produzir o utilitário Jeep Grand Wagoner. Mas só seria uma unidade Chrysler de fato em 1987, quando o grupo comprou a fábrica da AMC (American Motors Corporation). O tempo passou, o local passou a produzir Wrangler (agora, com mais de 1 milhão de unidades entregues) e Liberty (o nome americano da antiga geração do Cherokee), a aliança com os alemães da Daimler veio e se desfez, a crise chegou, a marca faliu e quase sumiu em 2008-09. Só não desapareceu por conta do governo e do dinheiro da Fiat.

Fábrica da Jeep em Toledo (EUA) - Eugênio Augusto Brito/UOL - Eugênio Augusto Brito/UOL
Na imagem de 1926, a Willys-Overland pré-carros e utilitários
Imagem: Eugênio Augusto Brito/UOL

TUDO LIMPO
Com aporte de meio bilhão de dólares (os US$ 500 milhões começaram a ser investidos na modernização de 2011), a unidade se transformou para fabricar a nova geração do Cherokee e, principalmente, para servir de exemplo: todos na unidade gostam de dizer que a fábrica opera no regime WCM (a certificação da World Class Manufacturing), com redução máxima de desperdícios, reuso de água, reciclagem de detritos e trabalhadores felizes.

Dentro da fábrica, saletas e corredores típicos de repartição pública fazem duvidar da modernidade divulgada. Mas basta pisar no chão de fábrica para passar a crer: na parede, murais e quadros coloridos lembram épocas de glória da marca; o chão liso e brilhante em nada lembra o ambiente repleto de de aço, óleo e aparas que muitos ainda associam a carros. "O chão polido foi a primeira providência tomada em 2011, pois quando todos enxergam o que cai, você evita o desperdício", afirma nosso guia pela linha de produção do Cherokee.

Fábrica da Jeep em Toledo (EUA) - Eugênio Augusto Brito/UOL - Eugênio Augusto Brito/UOL
Clima informal entre operários da linha de produção de Toledo.
Imagem: Eugênio Augusto Brito/UOL
Apesar do grande número de trabalhadores lotados em Toledo, o clima da linha produtiva lembra demais o filme "O Exterminador do Futuro": é difícil avistar humanos, para onde quer que olhe há mais estruturas gigantes de ferro e robôs. Muitos robôs: boa parte da fabricação é tocada exclusivamente por máquinas, em determinados momentos até 18 robôs operam simultaneamente. Manufatura, só na montagem de detalhes de painel, acerto de elementos da suspensão e similares. Apesar disso, o ar é leve, sem o odor característico de outras fábricas: a maior parte das soldagens executadas pelas máquinas se vale de método que elimina fagulhas -- quando inevitável, o processo é feito em área isolada.

Fábrica da Jeep em Toledo (EUA) - Eugênio Augusto Brito/UOL - Eugênio Augusto Brito/UOL
Murais retratam história da unidade ao longo de mais de 70 anos de produção de carros.
Imagem: Eugênio Augusto Brito/UOL
Neste clima diferente, os trabalhadores também se portam de outra forma: muitos parecem prontos para ir à academia, não para fabricar um carro. Homens vestem moletons ou jeans largos, blusões de times de beisebol ou astros do rap, bonés ou boinas; mulheres usam leggings, regatas ou tops, tênis coloridos e cabelos presos. Muitos usam fones coloridos gigantes na cabeça e quase ninguém é visto com mangões protetores, usados apenas em parte da linha de produção. "Os fones não são de proteção, eles estão ouvindo música de seus iPods", avisa outra guia.

No Brasil, mesmo com mecanização e robotização também em alta, ainda é comum ver operários manuseando macacos hidráulicos para erguer partes mais pesadas ou, por exemplo, transportar e fixar para-brisas. Aqui, nada disso é feito por pessoas. Peças mais delicadas são levadas por máquinas que correm por trilhos magnéticos na área comum de pessoas, como se fossem autoramas. E foi possível ver trabalhadores da área de montagem de painéis sentados em bancos móveis, que são deslocados para dentro das carrocerias -- nada de se torcer para entrar no carro. Não à toa, o total de acidentes foi reduzido a praticamente zero e a meta é entregar 500 mil unidades/ano.

Fábrica da Jeep em Toledo (EUA) - Eugênio Augusto Brito/UOL - Eugênio Augusto Brito/UOL
Laboratório de metrologia faz do Cherokee o mais seguro e confortável Jeep já produzido. Pernambuco terá área similar para desenvolver Renegade.
Imagem: Eugênio Augusto Brito/UOL

PESQUISA E LEGADO
Mas o grande orgulho da fábrica de Toledo está em outro galpão com chão ainda mais brilhante e paredes brancas. Trata-se do laboratório de metrologia, que usa lasers, sensores, scanners, gruas e braços robóticos de diferentes tamanhos e espessuras para medir visualmente, sonoramente e sensorialmente os projetos.

Antes de ir para a linha de montagem, um protótipo do novo Cherokee saiu de pranchetas e computadores diretamente para esta sala. Aqui, foi medido e testado ao limite para definir se frestas, conexões, encaixes e apoios davam ao carro a rigidez torcional correta. Com o trabalho, a Chrysler afirma que o novo Cherokee é "o Jeep mais moderno, mais seguro e mais bem construído já feito". E garante que o Renegade também será assim.

"O Brasil será o segundo local a contar com este tipo de laboratório", afirma nossa fonte, afirmando que este será outro legado de Toledo para Goiana, além do clima de limpeza e bem-estar dos trabalhadores.

É possível que as fábricas ainda compartilhem componentes: ainda não está prevista a exportação de carros ou componentes do Brasil para a América do Norte, mas o contrário pode ocorrer, já que Toledo produz ainda componentes da coluna de direção e conversores de torque (parte da conexão entre a caixa de câmbio automático e o sistema de tração) para diversas partes do mundo.

Viagem a convite da Chrysler