Topo

Trunfo da Strada, terceira porta vira porta-malas na versão Working

Eugênio Augusto Brito

Do UOL, em Una (Bahia)

18/10/2013 22h30

Todo jornalista automotivo que testou uma picape Fiat Strada com configuração mais extravagante -- Adventure e/ou de de cabine dupla -- já teve de responder, ao menos uma vez, à seguinte pergunta: "Quem compra picape, um carro de carga, para transportar gente?" A resposta é: existindo ou não este comprador, sua única opção será comprar um modelo da Fiat, o que explica a liderança total da marca no segmento. 

Dona de mais de 51% do mercado de picapinhas, que lidera há quase 14 temporadas, a Fiat faz questão de capitalizar em cima de sua "ousadia" -- apostar em variações para um segmento comercial que, portanto, deveria ser regido totalmente pela razão entre custo e benefício do veículo em questão. Foi assim quando lançou a picape compacta com cabine estendida em 2000; a versão aventureira (ou de suspensão elevada e cheia de plástico) em 2001; com diferencial blocante em 2008; com cabine dupla em 2009; e com câmbio automatizado em 2011. E também foi assim durante a apresentação da linha 2014 da Strada (releia aqui), na última terça-feira (15), que inclui uma inédita terceira porta na versão de cabine dupla, à la Hyundai Veloster ou, para ser mais correto, à la Volkswagen Kombi.

Mas acreditar apenas nisso como o segredo do sucesso é levar apenas parte da verdade na caçamba. Afinal, a própria Fiat apresentou, em outros tempos e modelos, inovações que deram em nada: por exemplo, o Palio manual sem embreagem (sistema Citymatic, uma espécie de avô do atual Dualogic Plus) e o Siena com câmbio de seis marchas...

Voltando ao presente e à liderança da Strada, esta veio não apenas por conta das inovações -- boa parte delas disponível, até então, apenas nas configurações topo da gama -- mas principalmente pelo fato da marca entregar tudo o que o consumidor pode procurar. Enquanto as rivais oferecem, no máximo, um pouco mais de espaço no habitáculo e adereços plásticos, a família Strada é variada a ponto de ter a versão adequada a quase ninguém e, simultaneamente, ter aquela que todos vão comprar.

Na contramão desse raciocínio, porém, a versão básica Working -- e portanto a mais vendida, por ter preço mais em conta e ser direcionada principalmente a atividades comerciais, como indica o sobrenome em inglês -- é também aquela a sofrer a maior e mais ferrenha concorrência, já que todas as concorrentes têm algo a oferecer neste patamar. E, aí sim, está a grande sacada da Fiat agora: a Strada Working sai do nível "pé-de-boi", se o cliente quiser assim, e passa a ostentar o maior número possível de configurações da gama, com todos os tamanhos de cabine, incluindo a dupla de três portas. A versão Trekking só sai de fábrica com cabine dupla e a Adventure, com estendida ou dupla.

Assim, se existir (e de fato existe) alguma demanda por picapinha de trabalho, mas que dê um "caldo" em outros momentos, será atendida sem que se precise apelar ao estilo mais descoladinho da Strada Trekking ou aos excessos (não só de plásticos e de tecnologia, mas também de preço) da Adventure. Estratégia que parece certeira e que deve ter aumentado a dor de cabeça de executivos e engenheiros rivais. 

É válido repetir os preços básicos:

+ Strada Working 1.4 Flex -- R$ 33.750
+ Strada Working Cabine Estendida -- R$ 36.870
+ Strada Working Cabine Dupla (3 portas) -- R$ 42.330
  

TERCEIRA PORTA VIRA PORTA-MALAS
UOL Carros andou pouco mais de 30 quilômetros a bordo da nova Strada Working Cabine Dupla, boa parte deste percurso em trecho rodoviário, mas aproveitando também para encarar um pouco de vias sinuosas e precárias do interior baiano e também estradinhas de terra de uma fazenda na região Una, porção continental próxima à badalada Ilha de Comandatuba.

MÃO NA PORTA

  • Eduardo Goes/Divulgação

    A foto acima mostra a localização da maçaneta da porta traseira direita -- a tal 3ª porta -- da nova Strada de cabine dupla. A imagem abaixo, o espaço no banco traseiro, com lugar para dois. Para acessá-la, é preciso abrir a porta do carona antes.

    Dessa forma, é possível não incomodar o motorista para acessar o banco traseiro. O mesmo não pode ser dito para quem se dispuser a viajar ali: o espaço traseiro é insuficiente para acomodar adultos com pernas se os ocupantes da frente tiverem pelo menos 1,80 m.

    Ou seja, raramente você vai se deparar com uma Strada Working de três portas carregando quatro funcionários de companhia telefônica e mais cabos e escadas na caçamba e sobre o teto, mas certamente verá duas pessoas e um monte de objetos no banco de trás, todos facilmente colocados. (EAB)

  • Eduardo Goes/Divulgação

Ainda que curto, o trajeto serviu para mostrar prós e contras dessa mistura de veículo comercial e carro de passeio com um toque inusitado. Em nossa opinião, a outrora insossa e defasada versão Working tem agora o pacote, e também o visual, mais adequado de toda a gama Strada. Apesar da frente totalmente coberta por plástico, a Working é mais harmônica e simpática que Trekking e Adventure.

Infelizmente, mudanças mais profundas poderiam ter sido aplicadas também ao interior da cabine. Apesar do painel de instrumentos atualizado -- tem computador de bordo e boa visibilidade --, ainda é vexatório dar de cara com traços antiquados e acabamento ruim, ambos herdados da primeiríssima Strada, ainda que um tecido até interessante recubra painéis de porta.

Aqui é preciso dizer que testamos, e agora de fato, um carro de ninguém -- ou uma "configuração fantasma", se preferir. Afinal, parodiando a pergunta inicial, quem compraria uma Strada de entrada (mesmo que com cabine dupla) valendo R$ 49.459? Pois este é o preço da unidade testada, equipada com opcionais como regulagem de altura para o banco do condutor (R$ 313), rádio USB/MP3 (sem tocador de CD, mídia em extinção, a R$ 177) e kits Celebration 3 (dois falantes, antena, direção hidráulica, volante com regulagem de altura, ar-condicionado e para-brisas degradê a R$ 4.046), Young 4 (rodas de liga leve aro 14, faróis de neblina e brake-light a R$ 813) e capota marítima para fechar a caçamba (R$ 735).

Há também um senão para o conjunto de rodas, suspensão e altura do solo, que só será um problema em momentos específicos. Por não ter a boa altura para o solo, nem as rodas aro 16, da Adventure, a Working pode raspar facilmente em valetas e lombadas se estiver carregada demais de pessoas e objetos. Em situações mais corriqueiras, o carro se mostrou acertado em curvas e frenagens e bem disposto, apontando o motor 1.4 Fire Evo de 86 cavalos (com etanol) como adequado para puxar os 1.106 kg -- o consumo no computador de bordo ficou em 6,3 km/l, dentro da média apontada pelo Inmetro.

No fim das contas, carregar tranqueiras acabe sendo essa a principal função do espaço e da porta extra, ao menos nesta versão. Ainda que a Fiat tenha ampliado a altura da caçamba (o ganho alegado chega a 100 litros para a configuração cabine dupla, 110 l para a estendida e 120 na simples), optar pela cabine mais ampla implica em abrir mão de transportar cargas mais compridas. E aí entra uma vantagem colateral da terceira porta: se facilita a entrada de pessoas ao interior da Strada, também facilita o acesso e a colocação de cargas sobre o banco traseiro, se ninguém estiver por ali.
 
O fotógrafo Eduardo Goes, autor das fotos que ilustram esta reportagem, pontuou bem a situação: "Sempre é chato colocar coisas menores na caçamba, nunca serve como porta-malas. Mas o banco traseiro pode funcionar assim com a porta nova".
  • Eduardo Goes/UOL

    Visual da Strada Working é o mais harmônico da nova linha, apesar das rodas pequenas