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Toyota Etios 1.5 XLS anda bem e acolhe mal a preço exagerado

Toyota Etios 1.5 XLS: comportamento dinâmico exemplar, interior raquítico, preço absurdo  - Murilo Góes/UOL
Toyota Etios 1.5 XLS: comportamento dinâmico exemplar, interior raquítico, preço absurdo Imagem: Murilo Góes/UOL

Claudio Luís de Souza

Do UOL, em São Paulo (SP)

30/03/2013 13h00

Nove meses atrás, em junho de 2012, UOL Carros teve seu primeiro contato com o Toyota Etios. Foi no Japão, com direito a poucas e monitoradas voltas num circuito fechado, ao lado do mar e bem longe de Tóquio. Foi rápido, mas suficiente para nos impressionar mal. Variações da frase "Achei que tinha ido ao Japão, mas pelo jeito vim parar na China" viraram a piada preferida entre os jornalistas que degustaram o Etios. Porque, francamente, o carro era tosco com um xing-ling.

Passou o tempo, o Etios vem sendo fabricado em Sorocaba (SP) desde setembro do ano passado, e as vendas do compacto da Toyota no Brasil ainda não permitem dizer se ele micou ou não micou. São cerca de 4.200 unidades do hatch em janeiro e fevereiro; é pouco, e o colocam na rabeira de todos os subcompactos e compactos do mercado. Mas o sedã vai bem melhor, com 3.134 emplacamentos no mesmo período (num segmento de menor volume) e brigando carro a carro com Renault Logan e Nissan Versa.

Claro: o hatch é o Etios do cliente comum, enquanto o sedã é praticamente outro carro. Muito maior, é o Etios que vai bem como táxi.

Abordamos agora a versão topo de gama do Etios hatch, a XLS com motor bicombustível 1.5 de até 96,5 cavalos de potência (até nessa vírgula o carro é irritante, percebam) e torque de 13,9 kgfm. Este surge a 3.100 rpm, característica fundamental para garantir a performance consistente do modelo, com boas saídas e retomadas e "conversa" harmoniosa entre câmbio e motor em qualquer velocidade. Suspensões simples, mas robustas, e assistência elétrica na direção são outros fatores que fazem do Etios um carro agradável de guiar.

O problema é que a versão que dirigimos, escolhida justamente por ser o topo da gama do modelo, tem falhas e lacunas imperdoáveis num carro de, digamos, uns R$ 30 mil. E o Etios 1.5 XLS custa R$ 42.790...

Externamente, o desenho do modelo é neutro, tendendo ao simpático. Com apenas 3,78 metros de comprimento, é o que dá para fazer -- não à toa, o Etios hatch lembra bastante o Nissan March, seu concorrente mais direto (e que custa, na versão top e esportiva SR com motor 1.6, R$ 40.590). Apesar de concebido na (e para a) Índia, o Etios é tipicamente um compacto oriental, com formas arredondadas para se diferenciar dos minicarros japoneses (os kei cars), geralmente quadradinhos.

Todas as deficiências graves do Etios estão da porta para dentro. Ficam ainda mais conspícuas por ser esta a sua versão mais completa e cara (na opção hatch). Listamos a seguir algumas delas, na ordem em que surgem no uso cotidiano do carro:

1) A chave tem comando de abertura das portas, mas ao travar ou destravar a buzina toca em volume altíssimo;

2) Para ter acesso ao porta-malas antes de entrar no carro é preciso destravá-lo via chave e ainda apertar duas vezes um botão na tampa traseira antes de levantá-la (se apertar só uma vez, ela trava novamente);

3) Ao manusear a chave, é comum acionar sem querer os botões de trava/destrava, com as consequências previsíveis (por exemplo, ligar o alarme com gente a bordo);

4) Não há regulagem de altura no banco do motorista, e os cintos de segurança dianteiros são fixos.

E tudo isso antes de ligar o Etios.

BOM, SÓ QUE NÃO
Como dissemos, em movimento o carro é gostoso de guiar, bem-disposto e, segundo os números do Inmetro, merecedor de nota A de consumo, tanto com etanol como com gasolina no tanque. Mas outras chateações vão surgindo ao longo do trajeto.

A maior delas, claro, é a posição absurda do painel de instrumentos, centralizado e apenas levemente virado para o motorista. É preciso desviar o olhar do tráfego, para a direita e ligeiramente para baixo, quando se quer ler alguma informação -- mas esse é só o começo do problema: a iluminação é ruim, os ponteiros do velocímetro e do conta-giros desaparecem num vão gigantesco e escuro atrás da escala (um erro inacreditável) e a telinha digital com indicador de combustível e odômetro é minúscula.

Não dá para entender, muito menos aceitar, um equipamento de nível tão baixo em plena segunda década do século 21.

O acabamento e a montagem da cabine estavam muito melhores neste carro do que na unidade dirigida no ano passado no Japão. Agora não encontramos rebarbas nem folgas ou vãos indevidos; o ruído geral a bordo é baixo e encaixes cuidadosos das peças fazem parte disso. Infelizmente, os plásticos (há várias texturas) têm aparência e sensação tátil pobres.

O sistema de som com entrada USB, de série nesta versão do Etios, inclui um par de alto-falantes e outro de tweeters, que servem apenas a quem viaja nos bancos da frente. Só descobrimos essa peculiaridade ao perguntar a um passageiro no banco de trás o que ele achava da notícia que o rádio acabara de transmitir. "Que notícia?" Sem falantes atrás, ele nada ouvira.

Curiosamente, um item descrito como de destaque nos materais promocionais do Etios, o porta-luvas com capacidade de 13 litros e refrigeração emprestada do ar-condicionado, também esconde um aparente erro (ou descaso) de projeto: a tampa abre (desaba) para baixo, em cima dos joelhos do passageiro dianteiro.

TEM DE MUDAR
Enfim. Poderíamos escrever muitos e muitos outros parágrafos nesse mesmo tom; no entanto, nossa conclusão não é a de que o Etios já é um carro condenado ao ferro-velho da história automotiva. O que ele precisa é de uma urgente e radical reforma interna, feita por alguém com bom gosto e bom senso, que saiba como é a cabeça do cliente brasileiro -- cada vez mais exigente quando o assunto é carro.

E então realinhar seus preços, para menos. Note que a versão top do Etios hatch está na mesma faixa de valor de modelos como Citroën C3, Peugeot 208 e Ford New Fiesta em suas versões de entrada. São carros maiores, modernos, mais potentes, globais (no sentido de estarem sintonizados com a Europa, não com algum outro BRIC) e também recheados com ABS, airbags, ar-condicionado e direção assistida.

E atenção, a versão "peladaça" do Etios, que nem nome tem, dotada de motor 1.3, custa o mesmo que um Chevrolet Onix de entrada. Ou seja, todos os preços do Etios estão equivocados, do piso ao teto.