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Cruze hatch quer agradar à elite, mas é melhor no 'trabalho braçal'

Na foto acima, o novo ângulo da família Cruze: traseira arrojada dá personalidade ao hatchback - Murilo Góes/UOL
Na foto acima, o novo ângulo da família Cruze: traseira arrojada dá personalidade ao hatchback Imagem: Murilo Góes/UOL

Eugênio Augusto Brito

Do UOL, em São Caetano do Sul (SP)

10/04/2012 12h34

A General Motors do Brasil apresentou na última segunda-feira (9) o hatchback Chevrolet Cruze Sport6, configuração dois-volumes do sedã médio global da marca. Conforme relatado por UOL Carros (releia aqui) o modelo está sendo fabricado na unidade de São Caetano do Sul (na Grande São Paulo, de onde também sai o três-volumes) há cerca de 20 dias, e já teve iniciada sua distribuição às concessionárias da marca de todo o país, onde será vendido com duas versões de acabamento e opção de câmbio manual ou automático, sempre de seis marchas. Vale a pena repetir os preços:

- Cruze Sport6 LT manualR$ 64.900
Traz, entre outros equipamentos, retrovisores externos com desembaçador, rodas de liga leve de 17 polegadas, direção elétrica, ar digital com filtro de partículas (AQS), rádio/CD com Bluetooth e MP3, interior com revestimento de tecido (incluindo painel), freios com ABS, EBD e PBA (sistemas antitravamento, de distribuição eletrônica de frenagem e força adicional para frenagem de emergência), controles de tração e de estabilidade, quatro airbags (duplo frontal e lateral) e caixa de câmbio manual (M32).

- Cruze Sport6 LT automáticoR$ 69.900
Complementa o pacote anterior com revestimento de couro preto e adota o câmbio automático (GF6).

- Cruze Sport6 LTZ manualR$ 77.400
Acrescenta retrovisor com rebatimento elétrico, maçanetas cromadas, teto solar elétrico, sistema keyless para portas e partida do motor, sensor de estacionamento e de iluminação, sistema multimídia com tela de 7 polegadas, navegador por GPS e som "premium", seis airbags e câmbio manual.

- Cruze Sport6 LTZ automáticoR$ 79.400
O pacote anterior, substituindo a caixa manual pela automática.

O motor é sempre o Ecotec Flex, de quatro cilindros, de 1,8 litro, 16 válvulas e duplo comando de válvulas continuamente variável, capaz de gerar 140/144 cavalos a 6.300 giros e torque de 17,8/18,9 kgfm a 3.800 rpm, com gasolina/etanol no tanque. Mais detalhes podem ser vistos aqui. Já a ficha técnica completa pode ser baixada clicando aqui.

Segundo os executivos da GM, com estas especificações e preços, o Cruze hatch deverá emplacar cerca de 1.100 unidades por mês, o que, oficialmente, não o colocaria na briga direta pela liderança do segmento de dois-volumes médios. Com um discreto sorriso no canto da boca, porém, algumas das fontes da marca afirmam que o Cruze sedã tinha metas semelhantes, mas com sete meses de mercado acabou surpreendendo ao entregar até 20% mais de unidades -- atualmente, o sedã é a segunda força de seu segmento, atrás de Toyota Corolla e um pouco à frente do novo Honda Civic.

Assim, fica fácil desvendar o contentamento esboçado pelos integrantes da Chevrolet: se repetir o desempenho do irmão mais velho, superando um pouco o estabelecido, o Cruze Hatch será facilmente o mais vendido de seu segmento -- algo jamais conseguido pelo antecessor, o Vectra GT.

UOL Carros: assista ao vídeo oficial do Chevrolet Cruze

CARO, NÃO?
Um empecilho para o sucesso, dependendo do ponto de observação escolhido, pode ser o preço do Cruze Sport6, que não vai para a garagem de ninguém (ao menos no período de lançamento) por menos de R$ 65 mil -- bem distante, portanto, da faixa "psicológica" do segmento, que costuma ser acima de R$ 50 mil e abaixo de R$ 60 mil.

Oficialmente, a marca usa a justificativa do alto nível de eletrônica e segurança embarcadas (ao menos quatro airbags, controles de tração e estabilidade, entre outros itens) e da sensação de luxo encontrada a bordo -- o revestimento interno é sempre citado, embora seja fácil perceber que requinte em tecido recobrindo o painel existe de verdade apenas em modelos extremamente exclusivos, como o Range Rover Evoque, que parte de mais de R$ 160 mil, aproximadamente três vezes o valor de um Cruze.

A estratégia de posicionamento do Cruze ficará clara somente daqui alguns meses, quando a renovação de linha da Chevrolet no Brasil estiver completa. Como havíamos ressaltado, a família Cruze (hatch e sedã) não conta com aquela que seria a versão básica, LS. Essa vaga, que no momento deixa alguns compradores tradicionais da marca sem escolha, será ocupada mais tarde pela acomodação do sedã Cobalt (que em breve receberá a versão automática com motor 1.8) e das versões mais caras do futuro Sonic (também com hatch e sedã).

Para quem está ligado no desenvolvimento global do Cruze, único modelo da marca vendido em todos os principais mercados do mundo, e se pergunta sobre a chegada da perua recém-lançada na Europa (com novo visual), um pequeno balde de água fria: a marca descarta qualquer plano imediato de contar com a configuração station wagon no país. O face-lift, claro, ficará para um momento oportuno.

Mas tudo tem dois lados: a GM sabe que precisa de uma opção familiar -- espaço para bagagem sem onerar a cabine de passageiros e uso múltiplo -- e vai escalar um SUV urbano (compacto, com tração 4x2 predominante) para a função. Este SUV já é conhecido do leitor de UOL Carros: ele será derivado dos revelados Buick Encore (Salão de Detroit) e Opel Mokka (Genebra) e, segundo alguns jornalistas especializados em segredos, deverá ser chamado de Chevrolet Enjoy. Com isso, a trilha a ser percorrida pela Chevrolet fica mais clara.

COMO ANDA O CRUZE HATCH
Já a forma como o Cruze hatch percorre os diferentes caminhos é amplamente conhecida. O comportamento do dois-volumes é idêntico ao do sedã. Logo após a apresentação estática do modelo, UOL Carros testou tanto a configuração manual quanto a automática do hatch, sempre na versão mais completa (LTZ), única disponibilizada pela GM no evento de lançamento e primeira a ser enviada às lojas do país.

O nosso veredicto pode ser antecipado: se puder e (principalmente) quiser escolher, opte pelo Cruze Sport6 manual, que permite um total controle das rotações e do regime de trabalho do motor e, na mão direita de um motorista experiente, pode ser a solução de boa parte dos problemas de ruído e consumo excessivos relatados por quem dirige um Cruze automático.

Infelizmente, porém, a GM indica outra realidade ao afirmar que espera vender 70% de sua frota de Cruze com câmbio automático (no sedã, o percentual é mais elevado e já passa de 80%). Ou seja, 80% dos donos de Cruze no país convivem com ruídos para receberem, em troca, menos esforço de braço direito e pé esquerdo no trânsito pesado. 

Especificamente sobre o hatch, é fácil afirmar: o carro tem presença, conta com o fator novidade a seu favor, mas acima de tudo é bem resolvido, em alguns pontos até mais que o sedã -- a nova traseira, inclinada em direção à frente, é seguida por lanternas em cunha (mas com elemento circular centralizado reunindo as luzes de posição e de freio, com ótimo efeito de iluminação) que apontam também no sentido da traseira para a dianteira, fugindo da caretice. Mas como também já dissemos, poderia andar mais, ter mais força, reduzindo a sensação de que se está num carro mais pesado do que ele realmente é.

Por dentro, temos uma cabine confortável e bem-equipada, mas sem exageros. Não estamos mais no tempo das "barcas", o que desagrada a alguns. O Cruze é um carro de formas compactas, pensado para enfrentar bem os diminutos espaços dos grandes centros urbanos. Portanto, nada de juntar cinco pessoas enormes, mais cachorro e a bagagem de todos a bordo e sair acelerando pela estrada. Isso sequer seria possível fisicamente, uma vez que o carro abriga bem até quatro pessoas de estatura mediana e alguns de seus pertences; o hatch conta com a vantagem de ter a boca do porta-malas maior, permitindo o embarque de cargas mais largas.

Em movimento, porém, não há diferença perceptível entre o dois e o três-volumes. E isso sequer no que diz respeito à estabilidade, já que o Cruze sedã conta com um terceiro volume curto (a diferença para o sedã é inferior a 9 cm), que causa pouco ou quase nenhuma saída expressiva de traseira -- a ponto de, internamente, o carro ser chamado de notchback (justamente um três-volumes com porta-malas pouco marcante, um dois-volumes-e-meio).

Em ambos, a suspensão trabalha de modo exemplar, filtrando as imperfeições do asfalto brasileiro. O mesmo pode ser dito da direção elétrica, permissiva em manobras, mas firme o bastante para dar segurança total ao condutor em velocidades altas. O resultado é que os passageiros não apenas sentem pouco as atribulações típicas de buracos, valetas e lombadas, mas também quase não ouvem batidas secas típicas do sofrimento do conjunto mecânico.

UOL Carros: os detalhes do Cruze hatch

Infelizmente, motor e câmbio "desafinam" do restante do conjunto. E isso também é conhecido de quem guiou o sedã, como dissemos. Mas a vocação para o berro do Ecotec pode ser minimizada com o uso da caixa de câmbio manual. Curto, de engates precisos e suaves na maior parte das trocas, o câmbio M32 permite ao motorista dosar o volume dos giros e utilizá-los de modo correto, de acordo com a situação. Na prática, isso permite estender o fôlego por vezes limitado dos 144 cavalos disponíveis e reduzir a voracidade do apetite do motor por combustível.

Enquanto o Cruze automático começa a reclamar com qualquer pressão extra sobre o pedal do acelerador, seja em pequenos aclives, ultrapassagens ou mesmo subidas de velocidade -- e é sabido que quanto mais o motor "grita", mas combustível é gasto --, o Cruze manual consegue, com a seleção correta, encarar aclives leves em quinta ou sexta marcha com tranquilidade, realizar ultrapassagens seguras e, o principal, manter um ritmo alto sem consumo nas alturas.

Embora cada uma das sessões de teste -- primeiro com o carro automático, depois com o manual -- tenha sido curta (cerca de 40 quilômetros cada), e predominantemente rodoviária, foi possível perceber uma diferença de consumo de etanol gritante. Com o Cruze hatch automático, o melhor momento indicado pelo computador de bordo ficou na casa dos 8 km/l, com o abismo por volta de 6,5 km/l, em momentos de maior tráfego. Para o manual, a pior marca foi de 10 km/l, chegando ao "auge" com 12 km/l. Obviamente, uma observação correta depende de maiores distâncias percorridas, mas com este exemplo justificamos nosso brado inicial: mesmo elitizado, um Cruze "braçal" com trocas manuais conduz a um caminho de maior sucesso.