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Mercedes Classe G é "trator de luxo" com assinatura AMG

<b>Mercedes G 55 AMG: visual parado no tempo esconde carro disposto a quase tudo</b> - Murilo Góes/UOL
<b>Mercedes G 55 AMG: visual parado no tempo esconde carro disposto a quase tudo</b> Imagem: Murilo Góes/UOL

Claudio de Souza

Do UOL, em Campinas (SP)

27/07/2011 22h50

A tendência do design automotivo, de um modo geral, é afilar cada vez mais os veículos e suas partes. Carrocerias ficam mais curvilíneas, elementos como faróis e retrovisores se adelgaçam. A Mercedes-Benz não foge à quase-regra: em termos visuais, a recente reestilização do best-seller Classe C foi pouco além de espichar os faróis. Mas há uma exceção no portfólio da marca alemã, mantida propositalmente "tosca" há mais de 30 anos: o Classe G.

Linhas e ângulos retos, faróis redondos, grade frontal que parece desenhada numa lição de artes do pré-primário, traseira de carro-forte: o "jipão" Classe G é uma lição de anacronismo estilístico, tanto quanto o é o Defender da Land Rover. Pode-se advogar em favor deles usando termos como "tradicionais" e "idiossincráticos", mas não dá para negar que são pontos fora da curva do bom senso. Basta compará-los a outros utilitários dessas mesmas duas marcas

O jipão -- aliás, melhor dizer "jipaço", como se verá adiante -- da Mercedes é vendido no Brasil desde 1991, mas os bons ventos que vêm empurrando as vendas de importados no país inflaram as perspectivas comerciais do Classe G. No ano passado, apenas nove unidades foram emplacadas por aqui. Para este ano, a projeção é chegar a 19 carros. Mais que o dobro.

Essa meta levou a Mercedes a realizar, até o final desta semana, uma ação de marketing para que jornalistas, concessionários e potenciais compradores (apenas a convite) conheçam de perto os predicados do Classe G, especialmente em situações fora-de-estrada -- a brincadeira inclui uma trilha na região de Campinas (SP), repleta de obstáculos intransponíveis por carros comuns. O motorista gasta cerca de 30 minutos para percorrê-la. UOL Carros a conheceu nesta quarta-feira (27). 

QUANTO É, COMO É
O Classe G é importado ao Brasil apenas na configuração assinada pela AMG, divisão de performance da Mercedes. Seu nome completo, portanto, é G 55 AMG, referência à capacidade cúbica de 5.439 cm³ (arredondado para cima, como nos 63 AMG) do propulsor de oito cilindros em V, sobrealimentação por compressor mecânico e 507 cavalos de potência.

Há um pequeno estoque do modelo para o Brasil, mas em geral um Classe G tem de ser encomendado à fábrica na Áustria e demora até seis meses para ser entregue, especialmente se o cliente desejar personalizá-lo -- há várias opções de revestimentos e cores internas. O preço sugerido pela Mercedes é de US$ 295 mil, ou seja, varia de acordo com o câmbio. Com a moeda dos Estados Unidos a R$ 1,60 o Classe G vai a R$ 472 mil. Nisso, difere completamente do Land Rover Defender, oferecido hoje a partir de R$ 130 mil.

A proposta atual do jipaço é unir desempenho off-road digno de caminhão e on-road (no asfalto) mais próximo de um sedã potente. Quase todos os SUVs atuais, de araque ou de verdade, prometem o mesmo.

No que se refere ao desempenho em condições de rodagem adversas, o Classe G cumpre seu papel com louvor. O sistema eletrônico de tração independente nas quatro rodas (4ETS), conjugado com a reduzida, dá conta da maioria dos desafios, como descida e subida de rampas de forte inclinação (capazes de paralisar de medo até motoristas experientes). Equipamentos como ABS (antitravamento) e EBD (distribuição de força) atuam automaticamente nos freios, mordendo os discos sem que haja qualquer toque no pedal.

  • Murilo Góes/UOL

    O Classe G consegue trafegar com inclinação lateral de até 54 graus, diz a Mercedes

Maior interação do motorista é requerida em situações extremas e específicas -- e aí entram em cena os três bloqueios de diferencial (traseiro, central e dianteiro), comandados por teclas individuais no painel. Seu acionamento descontinua o 4ETS, mas em compensação aumenta as chances de se desvencilhar de obstáculos mesmo que haja apenas uma roda em contato com solo firme: combinando-se os bloqueios, o torque de 69 kgfm pode ser direcionado integralmente para ela. Se a reduzida estiver acionada (também por tecla), sua relação dobra o torque para a vizinhança dos 140 kgfm.

Foi com o bloqueio do diferencial central acionado que UOL Carros pôde andar praticamente de lado com o Classe G ao longo de um barranco (e sem medo de capotar), como se pode ver nas fotos de Murilo Góes que acompanham esta reportagem.

Vale observar que o jipaço encarou na trilha da Mercedes desafios parecidos com os superados pelo menos bruto Classe ML, que há três anos ganhava uma versão a diesel. Basta observar as fotos, aqui.

ASFALTO, EU?
Se a disposição do Classe G para o off-road é óbvia, contemplando a primeira parte da dicotomia do SUV moderno, não se pode dizer o mesmo quanto à performance no asfalto -- palco exclusivo do carro nas mãos de 99% dos bacanas que podem comprá-lo.

O habitáculo segue o alto padrão da Mercedes, com materiais de bom gosto e todos os equipamentos de conforto e conveniência esperáveis de um modelo caro de uma marca premium. Mas essa não é a questão.

O fato é que a viagem a bordo do Classe G é repleta de emoções, em parte como resultado da suspensão ultrarresistente (com eixo rígido) que eleva a carroceria montada sobre duas longarinas. Ela é pau (ou ferro) para toda obra, mas em pisos constantemente regulares qualquer saliência provoca trancos.

O Classe G nem é tão longo (mede 4,66 metros), mas é bastante alto: seu 1,93 metro aborrece na hora de entrar na cabine (quem tem menos de 1,90 metro, ou seja, quase todo mundo, vai sofrer) e prejudica a estabilidade em velocidades mais elevadas.

A partir de 100 km/h já é possível sentir alguma trepidação; depois disso fica a dúvida sobre se alguém já ousou chegar aos propalados 210 km/h de velocidade máxima dessa configuração AMG. Os pneus cantam em curvas feitas a 60 km/h, e os mastodônticos 2.580 kg de peso-base do carro (na unidade de teste também havia três pessoas a bordo, mais a blindagem) obrigam a iniciar a frenagem muito antes do usual. E, obviamente, o consumo médio de gasolina (que a Mercedes preferiu não revelar) é quase obsceno: mesmo no trajeto de estrada o Classe G não faz mais do que 6 km/litro. O tanque recebe 80 litros.

BEBERRÃO À EUROPÉIA
A conclusão é simples: num mundo cada vez mais urbano, o Classe G é um verdadeiro trator, amigo da lama, das pedras e dos barrancos. Num mundo cada vez mais sinuoso, ele tem formato de caixas de sapato sobrepostas. Num mundo cada vez mais preocupado com o ambiente, ele é um legítimo "gas-guzzler" (algo como "beberrão") à moda européia.

Um executivo alemão do marketing da Mercedes estava no evento desta quarta-feira, e não demonstrou nenhum remorso por isso. "Simplesmente fazemos um carro que as pessoas querem comprar", disse ele.

A Mercedes espera vender este ano, em todo o mundo, 6.400 unidades do Classe G (incluindo as variações de motor menor e a diesel, não disponíveis no Brasil). São bem mais "pessoas querendo comprar" do que há cinco anos: em 2006 foram emplacadas 3.783 unidades globalmente.

Viagem a convite da Mercedes-Benz do Brasil