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Mulheres buscam independência e já compram 25% das motos no Brasil

Cicero Lima

Colaboração para o UOL, em São Paulo (SP)

07/03/2014 16h35Atualizada em 07/03/2014 19h41

Nas décadas de 1960 e 70, era praticamente impossível ver uma mulher pilotando uma motocicleta. Em um Brasil para lá de machista, moto era coisa de homem e lugar de mulher era em casa, cuidando dos afazeres domésticos.

Galãs da televisão ajudaram a reforçar a imagem do conquistador descolado que anda de moto, como Tarcísio Meira e sua sofisticada Honda CB 750 na novela "Cavalo de Aço". Já as mulheres eram associadas às duas rodas somente de duas formas: ou na garupa, ou em poses sensuais nas propagandas da indústria.

A fábrica espanhola Bultaco, por exemplo, usou a imagem  de uma modelo com cara de apaixonada e um cigarro na mão para dizer: "As meninas sabem: onde há uma Bultaco, há um homem". A inglesa Triumph foi outra a abusar do estereótipo da mulher conquistada, que se entregava ao poder da máquina e do homem.

Com o passar do tempo, o panorama da indústria nacional se transformou, em boa parte pela nova posição da mulher na sociedade e também no mercado consumidor. Segundo a Abraciclo (associação dos fabricantes do setor), Em 2013, o público feminino comprou uma em cada quatro de 1,7 milhão de motos comercializadas no país. Ou seja, 425 mil unidades foram adquiridas por mulheres, segundo a Abraciclo (associação de fabricantes do setor).

E o índice é maior a depender da marca e do local: a Suzuki vende 30% de suas motos a mulheres. E em regiões como a cidade de Itatiba (SP), 40% das motos novas são de propriedade de mulheres.

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    Em 2013, número de mulheres habilitadas a andar de moto subiu 12,5% e chegou a 4,5 milhões. Paulo Teles, instrutor de uma moto escola de São Paulo (SP), diz que o percentual de alunas já está maior que o de alunos em seu estabelecimento.

Em 2013, o Brasil ultrapassou a casa de 4,5 milhões de mulheres com CNH (Carteira Nacional de Habilitação) da categoria A, meio milhão a mais do que o registrado em 2012. E a previsão para os próximos anos é de um aumento ainda mais forte. “As clientes já não querem mais depender dos namorados, maridos ou irmãos. Elas querem a independência de ir ou vir na hora que bem entenderem”, afirma Hélio Gava, gerente de uma concessionária da Yamaha em Itatiba.

Diante de tamanho crescimento, as montadoras foram levadas a se mobilizar para atender -- e entender -- as mulheres, um novo tipo de consumidor que não se contenta em ser garupa, e tampouco se encaixa no perfil de "dona-de-casa". Para se adequar aos novos tempos, tiveram de repensar seus produtos e deixá-los mais leves, fáceis de pilotar e com apelos femininos.

INDEPENDÊNCIA
A mulher contemporânea vê na moto uma alternativa ao caótico transporte público. Mas se engana quem pensa que as motivações param por aí. Para muitas, tornou-se uma forma de encontrar independência, mas também opção de lazer, virando uma verdadeira paixão.

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    Fabricia Moraes, de 38 anos, virou motociclista há 11 e participa de um grupo de mulheres que viajam o país em eventos ligados às duas rodas, chamado "Guerreiras de Avallon".

    Atualmente, ela possui uma Suzuki GSX-R 750 (moto que está sendo montada por ela na imagem) e diz que sua presença nesses encontros desperta curiosidade, especialmente pelo porte e potência de sua máquina.

É o caso da profissional de marketing Fabricia Moraes, de Anápolis (GO). Dona de uma Suzuki GSX-R 750, ela faz parte do grupo "Guerreiras de Avallon", junto com várias amigas, e viaja para diversos eventos temáticos pelo país. "Sou viciada na adrenalina e na liberdade que só a moto é capaz de proporcionar", conta a motociclista de 38 anos.

Segundo Fabricia, a presença de um grupo feminino nesses encontros sempre desperta curiosidade, e a postura machista de alguns homens acaba sendo consequência, em muitos casos, da conduta das próprias mulheres.

"Algumas mulheres desistem assim que sofrem o primeiro susto, não é normal ver uma mulher pilotando motos tão rápidas, então somos tratadas como estrelas", pondera, antes de arrematar: "Mas, na estrada, somos todos iguais. O que faz a diferença é a potência da moto e a habilidade de cada um".

No universo das competições, as mulheres também começam a conquistar seu espaço aos poucos, como a piloto Ana Carrasco, de apenas 17 anos. Com pouco mais de 1,50 m de altura, a espanhola fez história no ano passado ao ser a primeira mulher a competir numa das três categorias do Mundial de MotoGP, no caso a Moto3.

Na última etapa da temporada, em Valência, ela obteve sua melhor posição final na carreira, um oitavo lugar. Passou longe da vitória, é verdade, mas deixou para trás nada menos do que 25 adversários do sexo masculino. Neste Dia Internacional da Mulher, Ana e Fabricia são exemplos de como elas mudaram e ainda estão mudando o mercado de motos no Brasil e no mundo.

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    Ana Carrasco, durante teste para a temporada 2014 da Moto3, no circuito espanhol de Jerez.