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Antes marginalizados, triciclos convencem como solução de mobilidade

Cícero Lima

Colaboração para o UOL

02/12/2013 20h07

Um é pouco, dois é bom três é demais. O conhecido ditado popular resume também a dificuldade imposta pela física a designers, mecânicos e engenheiros no desenvolvimento de veículos de três rodas. Com muito trabalho envolvendo erros e acertos, busca-se um triciclo que seja divertido e prático.

No que diz respeito à diversão, muitos fabricantes encontraram a fórmula certa. Quem já viu um triciclo de perto sabe o quanto veículo é carregado de carisma e cheio de detalhes chamativos. Mas ainda existe um grande desafio em pilotar estes veículos: há limitações em relação às frenagens e também ao contorno de curvas quando comparado a motos e carros.

Ainda assim, cresce o número de opções -- de soluções caseiras a projetos de grandes fábricas -- e estamos mais perto da revolução de mobilidade.

CUIDADO ARTESANAL
Os modelos artesanais não oferecem sistema de freio dianteiro e podem empinar a roda (que usa pneu de moto). Para prevenir um wheeling indesejado, alguns usam até rodinhas de apoio na traseira como os carros de arrancada.

Dino Martinez tem grande experiência com os triciclos e avisa: "A frente do triciclo é leve e exige muito cuidado nas subidas, pois dependendo da aceleração e inclinação da curva, você pode perder o controle do veículo".

Piloto de motos desde 1973, Martinez também já viajou milhares de quilômetros sobre seu triciclo cor de rosa, atração de eventos pelo Brasil. Com esta experiência, dá diversos avisos aos candidatos a dono de triciclo: é preciso ter muito cuidado com os obstáculos laterais por conta das enormes rodas traseiras; há ainda o fato do veículo reunir "o pior dos dois mundos", por ocupar o espaço de um carro no trânsito e forçar o condutor a tomar chuva com se estivesse sobre uma moto.

A maioria dos triciclos artesanais usa motor Volkswagen de Fusca, refrigerado a ar e movida a gasolina. Mas é possível comprar modelos com motor AP 1.6 flex. Em seu site, o fabricante by Cristo, enfatiza que a velocidade máxima é de 180 km/h, o que deixaria para trás boa parte das motos vendidas no Brasil.

Mesmo com o uso obrigatório do capacete, o prazer de sentir o vento no corpo compensa o horror de se ficar "travado no trânsito, atrás de caminhões ou ônibus", aponta Martinez. Tanto é assim, que há uma verdadeira legião de fãs destes triciclos. Clubes se espalham pelo Brasil atraindo apaixonados que gastam R$ 10 mil para ter modelos mais simples, que podem superar os R$ 50 mil dependendo da motorização e acessórios.

TECNOLOGIA DE FÁBRICA
Também com três rodas e recheado de eletrônica, o triciclo Cam An Spyder, produzido pela canadense Bombardier, deixa muito carro de luxo para trás. Freios com sistema ABS, SCS (controle de estabilidade) e TCS (controle de tração) o colocam em outro patamar de pilotagem, tecnologia e segurança.

Diferente dos triciclos normais, com uma roda na dianteira, o triciclo canadense traz duas rodas à frente e um compacto motor de dois cilindros em V de 900 cc produzido pela Rotax. O preço da brincadeira começa em R$ 56 mil.

Segundo Roberto Brandão, repórter da agência Infomoto que viajou em um desses modelos, "as reações na pilotagem são radicais, assim como a aceleração". Mas devido a sua largura, o Spyder segue refém dos congestionamentos das grandes cidades.

AGILIDADE DE SCOOTER
É possível ter o apoio da terceira roda e conseguir driblar o trânsito. Um exemplo é o italiano Piaggio MP3, que tem as mesmas dimensões (e peso) de um maxi-scooter. Construído em "Y", ou seja, duas rodas dianteiras, o modelo é equipado com motor de 400 cc e se destaca pelo comportamento da suspensão dianteira.

Ela permite que as rodas da frente inclinem até 40 graus, proporcionando curvas radicais e a mesma sensação de andar em um scooter normal. Mas o grande barato mesmo é o um botão que permite travar a suspensão quando o veículo está parado e em piso plano. Com isso não é necessário por os pés no chão para segurar o scooter, e o piloto pode desfrutar das três rodas em sua totalidade.

São comuns na Europa, mas no Brasil essa tecnologia tem preço elevado. Uma unidade usada do MP3, ano 2010, custa R$ 25 mil. Já um Piaggio zero-quilômetro de 300 cc  está avaliado em R$ 37.900.

Mas quem se interessa por esse tipo de veículo? Segundo o Ricardo Capelasso, da Global Scooter de São Paulo (SP), são pessoas que viajam para Europa e quando voltam ao Brasil querem usar um desses.

Recentemente a Yamaha lançou, no Salão de Milão, o conceito Tricity com motor de 125 cc. Embora seja um conceito, quando entrar em produção, no segundo semestre de 2014, deverá ter preço mais acessível que os atuais scooters de três rodas disponíveis no mercado europeu.

PRESCRIÇÃO MÉDICA
Bem longe da excentricidade ou da exclusividade, pessoas com limitações de mobilidade também encontram nos veículos de três rodas uma solução para problemas de locomoção. Muitos buscam empresas especializadas para adaptar um novo eixo traseiro à Honda 125 Biz.

"Muitas pessoas com necessidades especiais nos procuram, na busca de uma solução para seus problemas", afirma José Almir Garcia, conhecido como Negrão, da Mecânica Motor Gato, de Sertãozinho (SP). Junto com os dois filhos, desenvolveu essa adaptação em 1998. O serviço custa a partir de R$ 4.200 e pode ser o passaporte para uma nova vida para quem perdeu, ou nunca teve, a capacidade de ir e vir sem a ajuda de outras pessoas. Nesse caso, a terceira roda torna-se, na prática, sinônimo de liberdade e inclusão social.