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Por que a centenária Citroën derrapa no mercado de carros usados no Brasil?

Citroën C4 Lounge 2015 - Ivan Ribeiro/Folhapress
Citroën C4 Lounge 2015
Imagem: Ivan Ribeiro/Folhapress

04/06/2019 13h28

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Resumo da notícia

  • Modelos como C4 Lounge chega a perder 50% do valor em 3 ou 4 anos
  • Carros franceses ainda são vistos com desconfiança no mercado de usados
  • Uma das reclamações sobre a Citroën é a rede de assistência

Todo empreendedor escuta que a grande maioria das empresas não passam dos primeiros anos. Diante disso, uma empresa centenária merece, no mínimo, todo nosso respeito. É o caso da francesa Citroën, que acaba de atingir essa marca dos 100 anos, mas que convenhamos, não goza de muito respeito aqui no Brasil.

Na verdade, a imagem da Citroën é uma das piores por aqui. Tem sim uma legião de fãs, mas pequena diante dos críticos aos inusitados modelos da marca. Citar um Citroën nas redes sociais é sempre motivo de piada. Para essa coluna, por exemplo, eu tentei organizar um encontro com donos de Citroëns, que infelizmente foi cancelado por conta da chuva. Porém, não faltaram comentários irônicos questionando a quantidade de guinchos que estariam disponíveis no evento. Comparam os modelos com bombas, pois estão sempre prestes a "explodir".

Não era para ser assim. Basta uma rápida consulta na internet para ver a importância da Citroën na história automotiva. Foram inúmeras inovações técnicas e visuais, fora as conquistas de campeonatos de rali e de títulos de melhor carro do ano.

Então, por que a imagem da Citroën está tão ruim no Brasil?

Citroën XM - Divulgação - Divulgação
Imagem: Divulgação

Abertura das Importações

Eu conheci a Citroën por meio do fantástico XM, um dos últimos modelos de alto luxo da marca francesa. Eu era uma criança quando vi o desenho do carro pela primeira vez em uma de minhas revistas. Para um garoto, não tinha como não se apaixonar. Parecia uma máquina do tempo vinda do futuro.

Isso foi no início dos anos 1990, quando o Brasil voltou a receber carros importados. Até então, apenas quatro grandes fabricantes atuavam em nosso mercado, com modelos que pareciam peças de museu diante dos importados que passaram a circular em nossas ruas. O impacto foi grande, e a Citroën foi uma que descarregou suas "naves espaciais" por aqui.

Quase 30 anos depois, onde estão esses carros?

O citado modelo XM, simplesmente sumiu das ruas. Quando fiz as postagens sobre o encontro de Citroëns, publiquei fotos do XM e fiquei surpreso com a quantidade de pessoas que não conheciam esse carro. Nos maiores classificados de carros do país, eles raramente aparecem, diferente de outras marcas que também entraram em nosso país nos mesmos anos 90.

São muitos os motivos desses carros terem sumido em tão pouco tempo, e podem acreditar que são os mesmos que ainda travam a imagens e as vendas dos Citroëns no Brasil.

Mecânica duvidosa

Não demorou para o brasileiro perceber que a Citroën desconhecia completamente nossa realidade. Enquanto os quatro grandes fabricantes tinham carros aptos a encarar as ruas e estradas ruins do nosso país, a sofisticada suspensão hidropneumática não aguentava por muito tempo. E por ter peças de fora e necessitar de mão de obra especializada, o custo de reparo era muito acima da média. Mesmo os modelos mais simples, com suspensões convencionais, estavam subdimensionados para nossas ruas. Até hoje, os Citroëns tem fama de terem suspensões frágeis.

Além da suspensão, o câmbio automático de muitos Citroëns também são problemáticos, principalmente os modelos dos anos 2000, com a famosa caixa AL4. Os atuais usam um confiável câmbio japonês, mas nem todos sabem disso e ainda acreditam que são os mesmos do passado.

Já os atuais motores THP, presente em quase toda linha, tem muitas qualidades, mas alguns problemas crônicos de alto custo de manutenção. São recorrentes as quebras em bomba de alta e turbina.

Pós-venda ineficiente

Não deve ser fácil ter uma operação em todo território nacional. Não faltam exemplos de grandes empresas regionais, que se sustentam atuando apenas numa região específica. O mesmo não podemos esperar de um fabricante de carros. Não tem como escolher atuar somente numa grande metrópole, pois carros circulam por cidades e podem quebrar em qualquer uma delas. Quem chega por aqui, tem que pensar numa operação nacional, que consiga atender o máximo possível de cidades.

Não é o que acontece com a Citroën. Escuto de muitos clientes, espalhados pelo Brasil, que evitam comprar carros da marca por falta de assistência na cidade em que reside. Ao que parece, o grupo PSA pretende dobrar a rede de concessionárias nos próximos anos, e eu torço que isso se concretize, mas é pouco para quem está há tanto tempo por aqui.

Baixa liquidez

Esse problema não é só no Brasil. É famosa a frase de um jornalista europeu, que fala que a vida é muito curta para tentar vender um carro francês. Claro que é um exagero, mas de fato é bem mais complicado de se desfazer de um francês do que de qualquer outro carro. Todos os motivos que citei acima, repercutem no mercado de usados, que paga cada vez menos por esses carros. A desvalorização da Citroën é das maiores entre seus concorrentes. Alguns modelos, como o C4 Lounge, chegam a perder quase metade do valor em 3 ou 4 anos de uso.

Mas tem coisa boa?

Claro que tem coisa boa no mercado de usados. Se por um lado esses problemas fazem o preço dos Citroëns caírem, por outro acaba sendo vantajoso para quem busca uma boa relação custo/benefício. E agora, eu volto a falar da legião de fãs da marca.

Donos de Citroën pensam fora da caixinha. Saem do senso comum, que é comprar os modelos líderes das categorias, que são sempre bem vistos no mercado de usados, mas geralmente são simples demais. São pessoas que enxergam qualidades em seus carros e aprendem a conviver com os detalhes negativos.

Dos modelos atuais, o C3 com motor 1.2 de 3 cilindros é fantástico, e deve se dar bem no mercado de usados. Os modelos com motor 1.6 16v, antes mal vistos nas versões com câmbio automático, agora são confiáveis. Os motores THP, agora flex, tiveram aqueles problemas crônicos resolvidos, com peças mais robustas.

Dos mais antigos, os dos anos 2000, qualquer modelo com câmbio manual pode ser um bom negócio, desde que tenha um bom histórico de manutenção. Já os dos anos 90 esqueça. Deixe para aqueles loucos apaixonados por carros serem guardiões dos poucos que restam.

Aliás, eu me incluo nesse grupo de loucos e não descarto um XM na minha garagem. Espero que a vida ainda me reserve esse momento.